1969

Processo Civil Eleitoral

Electoral Civil Process

Leonardo Fernandes de Souza(1); Fernanda Vanessa Vassoler(2); Bruno Smolarek Dias(3)

1 Mestrando em Direito Processual e Cidadania pela Unipar – Universidade Paranaense, Analista do TRE-PR (Tribunal Regional Eleitoral do Paraná) e especialista em Direito Civil e Processo Civil.
E-mail: [email protected]

2 Especialista em Direito Previdenciário pela Unipar – Universidade Paranaense, Analista do TJ-PR (Tribunal de Justiça do Paraná), Assessora lotada em gabinete.
E-mail: [email protected]

3 Doutor em Ciências Jurídicas pela Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUC-PR. Professor do Programa de Mestrado em Direito Processual e Cidadania da Universidade Paranaense Unipar.
E-mail: [email protected]

Resumo

O presente trabalho visa analisar a proposta do processo civil eleitoral como resposta à necessidade do direito eleitoral de uma ciência processual que determine ritos céleres, para por fim as dúvidas e contradições hoje vividas pelo processo eleitoral (como processo jurisdicional). Trazendo o Código de Processo Civil 2015 como fonte suplementar e subsidiária. A metodologia utilizada foi a teórica bibliográfica.

Palavras-chaves: Processo eleitoral. Código de processo civil 2015. Processo civil eleitoral.

Abstract

This paper aims at analyzing the proposal of the electoral civil process as a response to the need of the electoral right of a procedural science that will determine rites quickly, to end the doubts and contradictions that are experienced by the electoral process (as a judicial process). Bringing the Code of Civil Procedure 2015 as a supplementary and subsidiary source. The methodology used was the bibliographic theory.

Keywords: Electoral process. Civil process code 2015. Civil electoral process.

1 Introdução

A questão processual eleitoral não recebe a devida atenção do direito, tendo como agravantes o fato de não ter um código processual e um procedimento com um desenvolvimento atrofiado com várias ações tratando de um mesmo assunto. Tal situação toma ares de crise com o fenômeno da judiciliazação das eleições, que tem aumentado em muito as demandas eleitorais.

Antes essa situação, o presente artigo analisa a possibilidade de aplicação do Processo Civil como balizadora do Processo Eleitoral.

No primeiro capítulo traça o objeto do presente artigo, pelo termo processo eleitoral ser utilizado pela doutrina com mais de um sentido, sendo por nisso necessário delimitar processo eleitoral como o processo jurisdicional de lides eleitorais, e não o procedimento para a escolha de candidato a cargo político.

No segundo capítulo apresenta-se a legislação processual eleitoral pós Constituição Federal de 1988, trazendo os vários textos legislativos, e evidenciando a verdade colcha de retalhos existente.

O terceiro capítulo aprofunda-se na relação entre o direito processual civil e o direito processual eleitoral, pois com o Código de Processo Civil 2015 levanta-se com ainda mais força a questão da aplicação deste à matéria eleitoral.

O quarto capítulo analisa os prós e contras da proposta de ter-se um direito processual civil eleitoral, com o processo civil trazendo a cientificidade e estabilidade necessário ao processo eleitoral.

2 Processos Eleitorais

Uma diferenciação que se faz necessário, antes de se adentrar na apresentação do Direito Processual Eleitoral, são as duas acepções possíveis para o termo processo eleitoral, “[…] o destaque dessa diferenciação é necessário pelo fato que de que a Justiça Eleitoral é responsável pela condução de ambos os ‘processos eleitorais’” (SILVA, 2010).

Explicando melhor, o “[…] ‘processo eleitoral’ pode ser utilizada em dois sentidos diferentes: como o procedimento de realização das eleições ou para individuar um processo jurisdicional eleitoral específico com autor, juiz e réu” (DANTAS, 2006, p. 85).

O referido termo apresenta-se mais comumente no sentido de ser o procedimento para a escolha dos representantes, sendo conhecido nesse caso como processo eleitoral em sentido geral (TAVARES, 2016, p. 18). O processo eleitoral nesse sentido é realizado através de vários atos realizados, tendo a Justiça Eleitoral como a responsável por esses atos e com o objetivo da concretização das eleições, como por exemplo, a nomeação dos mesários, registro de candidatura e sua impugnação, prestação de contas, propaganda eleitoral, seus respectivos recursos e diplomação (CASTRO, 2012, p. 4-5; ZILIO, 2016, p. 289).

O termo processo eleitoral refere-se ao período entre o início das convenções até a diplomação dos eleitos (BARROS, 2014, p. 40) e dessa forma seriam responsável pelas seguintes matérias: “[…] exercício do sufrágio e do voto, abrangendo as convenções partidárias, o registro dos candidatos, as regras de arrecadação e gastos nas campanhas eleitorais, a propaganda eleitoral, as eleições, a proclamação dos eleitos, a prestação de contas e a diplomação” (ESMERALDO, 2011, p. 25).

Essa primeira forma da expressão “processo eleitoral” também é conceituada como sendo o “[...] procedimento necessário à realização das Eleições, e aí, inclui-se tanto a organização do pleito eleitoral, pela Justiça Eleitoral, como também todos os atos necessários à sua realização por parte do candidato [...]” (VIGLIAR; CHALITA; 2016, p. 163).

A segunda forma que o termo se apresenta é no sentido da matéria que determina os pormenores dos trâmites dos procedimentos judiciais na esfera eleitoral, “[…] o processo eleitoral engloba todos os atos praticados na esfera judicial que têm a finalidade de realizar a jurisdictio, no que permite um pronunciamento judicial diante de um caso concreto” (AGRA, 2016, p. 219).

Essa acepção do significado do termo Processo Eleitoral faz referência ao “[…] controle jurídico-eleitoral, como sendo o conjunto de atos e procedimentos ordenados desenvolvidos perante um órgão jurisdicional com o fim de solucionar um determinado litígio de natureza eleitoral” (PEREIRA, 2015, p. 150).

Neste mesmo sentido “[…] o processo jurisdicional eleitoral é instaurado e se desenvolve perante órgão jurisdicional com vistas à resolução de conflito eleitoral; é individualizado, veiculando pedido específico entre partes bem definidas” (GOMES, 2016, p. 299). Este sentido do termo processo eleitoral refere-se ao Direito Processual Eleitoral.

A duplicidade de sentidos para o termo Processo Eleitoral é nociva aos estudos, “[…] por se tratar de temas diversos e com finalidades igualmente distintas, aconselha-se sejam diferenciadas também suas nomenclaturas, a fim de evitar confusões terminológicas” (PEREIRA, 2015, p. 150).

Como solução a doutrina especializada para o segundo sentido do termo processo eleitoral utiliza-se os seguintes termos: “processo jurisdicional eleitoral” (GOMES, 2016, p. 299), “contencioso judicial eleitoral” (ZILIO, 2016, p. 503), “processo judicial eleitoral” (DUARTE, 2016, p. 59), “direito processual eleitoral” (PAIM, 2016b, p. 49-50) e “processo civil eleitoral” (CERQUEIRA, CERQUEIRA, 2008).

As finalidades do processo eleitoral e do processo judicial eleitoral também são diversas, o que ajuda a entender melhor a diferenciação. O processo eleitoral têm como finalidade a busca da verdade eleitoral, com a manifestação da soberania popular através do voto livre do eleitor, sem fraude ou violência (SILVEIRA, 1998, p. 16), enquanto o processo jurisdicional eleitoral tem a finalidade “[...] à realização do direito, e tem uma estrutura e uma função, geralmente constando de uma pluralidade de atos, pelo que também se chama de procedimento” (FERREIRA, 1991, p. 13).

Ao se analisar o Direito Processual Eleitoral percebe-se que seu estudo ainda não está destacado do seu direito material, ou seja, do Direito Eleitoral. Apesar das diferenças conceituais, a doutrina analisa as duas matérias como um amálgama, como se fossem apenas uma só matéria.

Em que pese à importância do direito processual eleitoral, certo é que não há uma autonomia científica e independência em relação ao direito eleitoral, inexistindo um estudo mais aprofundado sobre a temática, podendo-se vislumbrar um estágio não muito distinto da fase sincrética do direito processual, impondo-se o estudo mais aprofundado da matéria, especialmente para atenuar a insegurança jurídica existente. (PAIM, 2016b, p. 52).

A parte processual do direito eleitoral não recebe o devido aprofundamento por parte da doutrina e também da jurisprudência, sendo considerada como “[…] um daqueles territórios ‘excêntricos’ do Direito, cujo acesso é prejudicado pelo pouco interesse despertado, bem como pela sua clausura técnica e cujo manejo é relegado a apenas alguns poucos iniciados” (PEREIRA, 2015, p. 147).

Seguindo este mesmo sentido: “O direito processual eleitoral, conquanto possua uma importância capital na proteção e asseguração de institutos fundamentais da democracia (sufrágio popular, partidos políticos), no entanto nunca foi tratado à sua altura” (RODRIGUES, 2010).

E é inegável a importância do direito processual para os fins do direto eleitoral, “[…] para a contenção do abuso de poder se faz necessário a utilização dos instrumentos processuais adequados à aplicação das normas que buscam equilibrar as oportunidades e as condições de competição dos candidatos, partidos e coligação.” (COÊLHO, 2016a, p. 283).

É reconhecida pela doutrina a importância dos instrumentos do processo civil eleitoral que são as ações civis eleitorais, para o combate a toda e qualquer forma de fraude e o abuso nas eleições: “[…] é por meio destas ações cíveis eleitorais que, essencialmente, se apuram condutas lesivas à legislação eleitoral que não sejam tipificadas como crime, tutelando, pois, a legalidade do processo eleitoral” (BERNARDI, 2016, p. 219).

Classificam-se as ações cíveis eleitorais em:

(a) AIRC – Ação de Impugnação de Registro de Candidatura; (b) Representação e Reclamação; (c) AIJE – Ação de Investigação Judicial Eleitoral; (d) AIME – Ação de Impugnação de Mandato Eletivo; e (e) RCD – Recurso Contra Diplomação. Ainda pode ser citado o RRC – Requerimento de Registro de Candidaturas, ou ação de registro de candidaturas, com a qual encontram-se vinculadas as respectivas eventuais impugnações; e as impugnações de pesquisa eleitoral; bem assim o requerimento de direito de resposta. (BERNARDI, 2016, p. 219).

As ações cíveis eleitorais são conceituadas como “[…] aquelas que prevêem sanções tipicamente político-eleitorais, consistentes em restrições ou limitações de direitos, precipuamente, na esfera especializada.” (ZILIO, 2016, p. 504). Das ações eleitorais decorrem, no caso de serem acolhidas, as “[…] sanções de cassação de registro ou diploma, inelegibilidade e desconstituição do mandado eletivo” (ZILIO, 2016, p. 504).

3 A Legislação Processual Eleitoral pós CF/88

A Constituição Eleitoral é o principal marco legislativo de todo o ordenamento brasileiro, “As normas gerais relativas aos direitos políticos estão presentes na Constituição, e abrangem o alistamento eleitoral, condições de elegibilidade e casos de inelegibilidade, perda, suspensão e cassação de direitos políticos” (LIMA, 2011, p. 76).

Pode-se afirmar que “[…] a Constituição Federal é a base de todo sistema que contempla o Estado Democrático de Direito, fundado na representação e soberania popular” (SOBREIRO NETO, 2008, p. 22), e não é diferente com a questão das normas processuais eleitorais: “As estreitas relações entre Constituição e processo são cada vez mais destacadas pelos publicistas, estabelecendo a Carta Magna as linhas essenciais do sistema processual adotado no Estado.” (PIMENTA, 2002, p. 103).

Necessário esclarecer que “as normas gerais relativas aos direitos políticos estão presentes na Constituição, e abrangem o alistamento eleitoral, condições de elegibilidade e casos de inelegibilidade, perda, suspensão e cassação de direitos políticos” (LIMA, 2011, p. 76).

O Código Eleitoral vigente no Brasil é da época da ditadura militar, a lei nº 4.737/65, o quinto código eleitoral na história:

O Código Eleitoral contém normas destinadas a assegurar a organização e o exercício de direitos políticos, precipuamente os de votar e ser votado.

[...]

O Código também regula a Justiça Eleitoral, o alistamento, as eleições, as garantias eleitorais, a propaganda partidária, os recursos e os crimes eleitorais, afora disposição sobre os partidos políticos e as inelegibilidades, que foram depois objeto de estatutos especiais (BARROS, 2014, p. 4).

O Código Eleitoral em grande parte não foi recepcionado pela Constituição Federal ou foi revogado por legislações posteriores, entretanto: “[…] continua vigente, apesar de ser editado em período de ausência de democracia e do decurso de mais de duas décadas de restauração democrática” (SALGADO, SOBREIRA, 2016, p. 127).

Sobre a recepção do Código Eleitoral pela Constituição de 1988, é importante ressaltar que foi recepcionado como lei complementar no que se refere à organização e competência da Justiça Eleitoral, para estar em consonância com o caput do art. 121 da Constituição Federal (CÔELHO, 2016a, p. 27-28; GONÇALVES JÚNIOR, 2016, p. 53).

Até 1.997 para cada eleição surgia uma nova legislação eleitoral, imperando assim regras próprias para cada eleição: “[…] o Direito Eleitoral Brasileiro até as eleições de 1996, conviveu com o fenômeno da temporariedade das leis. Para cada eleição era editada uma lei determinada, cuja vigência expirava ao final do pleito” (ZILIO, 2016, p. 22). Com uma legislação nova para cada eleição “[…] nem bem os agentes do jogo político familiarizavam-se com suas regras e já havia regras novas a serem estudadas para a eleição seguinte” (BOLZONI, 2014, p. 77).

Em 1.997 surge a Lei 9.504, chamada de “lei das eleições”, uma lei que passava a gerir as eleições em geral. A presente lei surge do projeto de Lei 2.695 de 08.01.1997, a autoria foi do então deputado Federal Edinho de Araújo (PMDB-SP), nessa origem a lei visava apenas as eleições, sendo que o relator o Deputado Carlos Apolinário (PMDB-SP) optou pelo sentido perene dessa lei e que ela viesse a regular todas as eleições futuras, sendo então a lei 9.504 sancionada em 25.09.1997 (CONEGLIAN, 2016, p. 11-12; CÂNDIDO, 2016, p. 353).

A Lei 9.504/97 inovou a legislação da época nos seguintes tópicos:

[…] o prazo de um ano para domicílio e filiação a um partido para se candidato; normas detalhadas para prestação de gastos de campanha; uma nova data para a realização das eleições (primeiro e último domingo de outubro); número de candidatos que um partido pode apresentar para cargos proporcionais; e critérios para a realização de debates, divulgação da propaganda eleitoral e distribuição do tempo do horário eleitoral no rádio e na televisão (NICOLAU, 2012, p. 125).

A lei das eleições legisla sobre (praticamente) todas as matérias relativas ao processo eleitoral:

[...] regras sobre coligações (art. 6º), convenções partidárias para escolha dos candidatos (art. 7º a 9º), registro de candidatos (arts. 10 a 16), arrecadação e aplicação de recursos nas campanhas eleitorais (ats. 17 a 27), prestação de contas (arts. 28 a 32), pesquisas eleitorais (arts. 33 a 35), direito de respostas (art. 58), sistema eletrônico de votação e totalização de votos (arts. 59 a 62), mesas receptoras (arts. 63 a 64), fiscalização para as eleições (arts. 65 a 71), condutas vedadas (art. 73 a 78). Prevê também crimes eleitorais (v.g., art. 39, §5º e art. 4º), além de estabelecer procedimento para apuração de descumprimento às normas nela estabelecida (art. 96). (ZILIO, 2016, p. 22-23).

Com a Lei 9.504/97 buscava-se uma estabilidade na legislação eleitoral, entretanto “[...] essa lei tem sido constantemente modificada por ‘minirreformas’ nos anos que precedem as eleições” (SALGADO, SOBREIRA, 2016, p. 128), assim “[...] a cada eleição, mais uma minirreforma desfigura ainda mais o já confuso quadro legislativo, praticamente restaurando o sentimento de temporariedade das leis eleitorais” (ZILIO, 2016, p. 22).

Nos últimos anos a lei 9.504/97 sofreu várias alterações, entre as principais leis que a alteraram podemos citar: Lei nº 11.300/2006 (eleições 2006), Lei nº12.034/2009 (eleições 2.010), Lei nº 12.891/2013 (eleições 2014) e Lei nº 13.165 (eleições 2016) (SALGADO, SOBREIRA, 2016, p. 128).

A consequência é que “[…] a fluidez das normas eleitorais, extremamente cambiantes, gera uma carência de uniformidade, de sistematicidade contribuindo para a dificuldade de cognoscibilidade do direito eleitoral.” (PAIM, 2016b, p. 54).

A Lei de Inelegibilidade, a LC nº 64/90, trata em sua maior parte de direito material eleitoral, instituindo as inelegibilidades infraconstitucionais (conforme o art. 14, §9º da Constituição Federal), mas também trata dos procedimentos da Ação de Investigação da Justiça Eleitoral (AIJE) e Ação de Impugnação do Registro de Candidatura (AIRC) (RODRIGUES, 2010).

A Lei nº 9.096/95 “[…] trata da criação, da organização, do funcionamento e da extinção das agremiações partidárias no país, regulamentando os art. 14, §3º, V e 17, da Constituição Federal” (CÔELHO, 2016, p. 29). A referida lei trata também:

[...] da organização, funcionamento, criação registro, programas e estatutos partidários, da afiliação, da fidelidade e da disciplina, da fusão, incorporação e extinção dos partidos, do financiamento e da contabilidade das agremiações, bem como da prestação de contas, dos recursos públicos e sua divisão, do acesso gratuito ao rádio e à televisão, com cláusula de desempenho considerada para a divisão de recursos e tempo de propaganda (SALGADO, SOBREIRA, 2016, p. 128).

Parte da doutrina entende que as questões envolvendo partidos políticos não pertencem ao Direito Eleitoral e sim a uma matéria própria, que seria o Direito Partidário (ALVIM, 2012, p. 33).

A Lei nº 9.840/99, conhecida como Lei dos Bispos por intenso movimento da CNBB Confederação Nacional do Bispos para a aprovação de projeto liderado por Aristides Junqueira Alvarenga (SCARPINO JÚNIOR, 2016, p. 67), acresceu o art. 41-A na lei 9.504/97, que constitui a vedação a captação ilícita de sufrágio com pena de cassação do registro ou do diploma.

O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) em 10 de junho de 2007 deu início a Campanha Ficha Limpa com a intenção de “[…] dar resposta à crescente demanda social por aumento do rigor nos critérios para a definição de candidaturas e à determinação constitucional contida no art. 14, §9º, da Constituição Federal, [...]” (REIS, 2012, p. 55).

A LC nº 135/2010 contou ainda com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil OAB e o Conselho Nacional dos Bispos (DOMINGUES FILHO, 2012, p. 82), sendo recolhidas 1.516.479 assinaturas (STRAPAZZON, 2010).

E como resultado deste projeto no dia 07 de junho de 2010 é publicada no Diário Oficial da União a LC nº 135/2010, a Lei da Ficha Limpa, e trouxe ao ordenamento jurídico “[…] hipóteses de inelegibilidade decorrentes da condenação por órgãos colegiados, dispensando o trânsito em julgado, entre outras inovações” (CÔELHO, 2016, p. 30).

A Lei da Ficha Limpa, traz alteração de grande impacto na questão da inelegibilidade, pois “Além de aumentar o período de suspensão de três para oito anos para aqueles que tenham condenação confirmada pela justiça Eleitoral em processo de investigação por abuso de poder econômico ou político, deixa-se exigir decisão transitada em julgado” (SALGADO, SOBREIRA, 2016, p. 131).

A legislação eleitoral é caracterizada por um emaranhado de mini-reformas, e apesar do já citado avanço da lei 9.504 de 1.997, ainda paira a incerteza de uma “nova legislação” a cada eleição, pois a Lei 9.504 já sofreu várias reformas.

As mudanças constantes na legislação eleitoral desestabilizam a possibilidade de se ter uma legislação estável: “no Brasil, desde sempre, as regras eleitorais se sucedem rapidamente, sendo alteradas em larga ou pequena escala, em mudanças constantes, sem sistematização, sem coerência” (SALGADO, 2010, p. 25).

Pode se afirmar assim que “Em relação ao Direito Processual Eleitoral, a legislação é, claramente, insegura e claudicante, visto que se limita, em textos esparsos, disciplinar os ritos procedimentais” (PAIM, 2016a, p. 149). Neste mesmo sentido: “Não há lógica na legislação eleitoral. Seus dispositivos mostram-se contraditórios e sua aplicação leva a ‘situações objetivamente paradoxais’, o que dificulta estabelecer a unidade do Direito Eleitoral” (SALGADO, 2010, p. 25).

Acrescendo ainda o problema do excesso de leis esparsas (que não preenchem o vazio procedimental),

[…] no âmbito legislativo do Direito Eleitoral, a multiplicidade de leis, resoluções e normas diversas enseja a árdua tarefa na busca do texto em vigor e sua exata aplicabilidade, causando extremas dificuldades ao exegeta e à fiscalização do amplo processo democrático (RAMAYANA, 2008, p. 6).

Tendo como agravante o fato de que são “[...] leis esparsas concebidas em tempos diferentes, sem o compromisso com um sistema organizado. E é possível dizer que já foi pior” (PEREIRA, 2016, p. 146).

E essa situação não deixa de ser sentida na realidade das questões que envolvem o processo eleitoral, “A ausência de um documento que reúna de forma clara e objetiva todos os elementos caracterizadores de cada um dos instrumentos processuais eleitorais origina incertezas e inseguranças para todos os envolvidos no processo eleitoral” (ESMERALDO, 2011, p. 26).

Existe grande dificuldade quanto a aplicação da legislação eleitoral, pois apesar de existirem diversas ações eleitorais existem poucas previsões dos procedimentos, “[…] somente a LC nº 64/90 traz a previsão de dois procedimentos específicos (arts. 3º a 14 e art. 22), além do rito sumaríssimo previsto no art. 96 da Lei nº 9.504/97 para algumas representações” (BORBA, 2016, p. 16).

Existem também muitas críticas as resoluções emitidas pela Justiça Eleitoral a todas eleições, pois “[…] compromete em certa parte o processo democrático de produção das leis, na medida em que retira do Poder Legislativo tal atribuição” (FARIA, 2012, p. 54).

Pelo histórico apresentado conclui-se que a legislação processual eleitoral é caracteriza pela “[…] adoção de casuísmo e dando guarida a interesses corporativos da chamada ‘classe política’, ao sabor das conveniência e das circunstâncias”. (PIMENTA, 2002, p. 114).

Não se pode ignorar a existência desde 2010 de uma comissão de juristas para elaboração de um anteprojeto de Código Eleitoral, em que se prevê a delimitação não só do direito material mas também do direito processual, entretanto, “[…] houve inúmeras prorrogações dos trabalhos, ainda não tendo sido apresentado qualquer resultado concreto” (PAIM, 2016a, p. 171).

4 Relevância do Processo Civil (CPC 2015) no Processo Eleitoral

4.1 O Código de Processo Civil de 2015

O Código de Processo Civil (CPC) não pode ser analisado apenas como uma atualização legislativa, mas sim como a aplicação de um novo sistema, com alterações profundas no direito processual brasileiro.

O Código de Processo Civil de 1973 (CPC 1973) se apresentava nos últimos anos como não mais correspondendo as necessidades que a sociedade atual espera e não mais adequado com a nova ordem jurídica que se forma após 1988, pois “[…] revela-se em total desconexão com o sentido como devem ser compreendidos os institutos fundamentais do processo, após a Constituição Federal de 1988.” (MEDINA, 2016, p. 75).

A referida dissonância do CPC 1973 com a nova ordem democrática implantada pela Constituição Federal de 1988, se justifica pelo CPC de 1973 estar “[...] impregnado pelo contexto autoritário da primeira metade do século XX – não só em razão do Estado Novo vigente no País, mas por toda a onda totalitarista que assolava a democracia no mundo” (COÊLHO, 2016, p. 203).

A necessidade de um novo código de processo civil era uma realidade já reconhecida pela doutrina:

Ao final da primeira década de 2000, já era voz corrente na doutrina brasileira a necessidade de se edificar uma nova estrutura processual condizente com a realidade social que se criou após a redemocratização do Brasil e as conquistas sociais adquiridas pelo povo em virtude de um estado cada vez mais prestacionista. (PAULA, 2016, p. 21).

Através da Lei 13.105/2015 de 16.03.2015, foi aprovado o novo Código de Processo Civil trazendo consigo mudanças estruturais solicitadas pela doutrina e pela jurisprudência:

[...] seu maior mérito está em reconhecer a importância principiológica, bem como na previsão de conceitos indeterminados que permitem que o juiz possa preencher o conteúdo valorativo, o que confere adequação do texto ao tempo e ao espalo, sem a necessidade de reformas constantes da lei processo (ARAÚJO, 2016, p. 244).

O CPC de 2015 “[…] se apresenta como proclamador de novos tempos, eis que sua alta densidade democrática está caracterizada por tratar-se do primeiro código proposto, debatido, aprovado e sancionado no regime democrático” (SANTANA; PEREIRA, 2016, p. 37).

A Constituição Federal “[…] é o ponto de partida para a compreensão adequada do que é o processo civil” (WAMBIER; TALAMINI, 2016a, p. 57). E desta forma, o artigo 1º do CPC de 2015 demonstra claramente a constitucionalização do Direito Processual Civil (DIDIER, 2015, p. 47), e esta afirmação consta explicitamente no CPC/2015 no seu art. 1º, “[…] o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidas na Constituição da República Federativa do Brasil [...]”. Pois o CPC/2015 foi pensado e redigido para dar eficácia as normas e princípios contidos na Constituição Federal.

O CPC de 2015 não se limita a inovar o processo civil, mas “[…] traz consigo inovações para o direito brasileiro no intuito de entregar uma prestação jurisdicional mais célere e justa, entendendo-se por justa aquela mais próxima da realidade factual” (PAULA; SILVA, 2015, p. 75). Marcando assim um novo período para a ciência processual como um todo.

4.2 Aplicação do Código de Processo Civil ao Direito Eleitoral

Não se pode negar a relação do processo civil e o direito eleitoral, pois é o direito processual civil que “[…] fornece à processualística eleitoral valorosa contribuição, de maneira que se tem por aplicáveis, no processo e julgamento das ações eleitorais, inúmeros institutos previstos no Código de Processo Civil [...]” (ALVIM, 2012, p. 29).

Os princípios do direito processual civil eram amplamente aplicados ao direito eleitoral antes mesmo do CPC de 2015: “[...] todos os princípios do processo civil previstos na Constituição Federal, tais como o princípio da ampla defesa, do devido processo legal e da inafastabilidade da jurisdição, aplicam-se também na seara eleitoral” (CHAMON, 2010, p. 199).

O CPC de 2015 traz uma regulamentação do direito processual de forma geral, não podendo ser definido como um código que trata apenas das questões materiais de direito civil:

Note-se que o termo “civil”, ainda que tradicionalmente usado, deve ser compreendido com muito cuidado, especialmente em sistemas como o vigente no Brasil. Como dito, “processo civil” significa, entre nós, processo não penal, não criminal, e não apenas processo destinado a solucionar causas de direito civil em sentido estrito. É que o processo “civil” brasileiro também versa sobre causas públicas (direito tributário, administrativo, econômico, ambiental, etc.). Além disso, mesmo no âmbito do direito privado, o nosso processo “civil” atinge matérias que não são de direito civil em sentido estrito (ex. direito empresarial, direito do consumidor etc.). (WAMBIER; TALAMINI, 2016a, p. 38).

O processo civil assim como o processo penal “[…] subsidiam o processo jurisdicional eleitoral, havendo diversos ritos estabelecidos para a solução de lides de natureza político-eleitoral, administrativa e penal”. (GOMES, 2016, p. 40).

O artigo 15 do CPC 2015 prevê expressamente que: “Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente”.

Em uma primeira leitura do artigo 15 do CPC 2015 pode trazer uma falsa impressão de que o direito processual civil só se aplica ao direito processual eleitoral quando houver ausência de regulamentação pelas normas da legislação eleitoral, isso no entanto não é uma conclusão correta, pois “[…] o legislador disse menos do que queria. Não se trata somente de aplicar as normas processuais aos processos administrativos, trabalhistas e eleitorais quando não houver normas, nestes ramos do direito, que resolvem a situação” (WAMBIER et al., 2016a, p. 84). E isso fica comprovado ao se estudar as diferenças da aplicação supletiva e subsidiária.

Referente a análise das expressões “supletiva” e “subsidiariamente”, “[…] inobstante parecerem expressões sinônimas, o contexto em que foram empregadas apresenta diferenças substanciais, não só quanto ao seu significado, como na que diz respeito ao conteúdo de intensidade integrativa” (REIS; SAMPAIO JÚNIOR; MATEUS, 2016, p. 14).

Tratar os termos supletiva e subsidiária como sinônimos é negar uma alteração expressa trazida pelo CPC de 2015 (), pois o CPC de 1973 não trazia (expressamente) nenhuma determinação de sua aplicação ao direito eleitoral, mas era pacífico que anteriormente ao CPC 2015, aplicava-se apenas caso não houvesse previsão específica na legislação eleitoral (CHAMON, 2010, p. 199).

Por força do CPC 2015 as regras do Código de Processo Civil aplicam-se ao processo eleitoral, “[…] de forma supletiva, no que serve para colmatar omissões, ou de forma subsidiária, no que ajuda o processo eleitoral na sua busca pela cristalização da vontade dos eleitores (art. 15 do CPC)” (AGRA, 2016, p. 222).

Através da força do referido artigo o CPC de 2015 estende seus efeitos “[...] não apenas para o caso de completa ausência legislativa, como também para quando o texto ou mesmo o sentido de uma legislação já existente pode ser completada pelo conteúdo do caderno processual cível.” (BORBA, 2016, p. 18).

Assim deve se aplicar sentidos diversos para as expressões supletiva e subsidiária, pois a legislação previu as duas expressões, assim o legislador “[…] não deve ter suposto que significam a mesma coisa, senão, não teria usado as duas.” (WAMBIER et al., 2016a, p. 84).

A aplicação supletiva “[…] significa que uma norma deixa de disciplinar um tema: há uma ausência, uma ‘anomia particularizada’, motivo por que a norma de outro ramo do Direito irá ser aplicada. A norma supletiva aplica-se para colmatar essa lacuna.” (PELEJA JÚNIOR, 2016b, p. 21-22).

Em um sentido diferente (em comparação com a aplicação supletiva), tem-se a aplicação subsdiária, que trata “[...] de uma possibilidade de enriquecimento, de leitura de um dispositivo sob outro viés, de extrair-se da norma processual eleitoral, trabalhista ou administrativa um sentido diferente, iluminado pelos princípios fundamentais do processos civil.” (WAMBIER et al., 2016a, p. 84).

Assim a diferença entre aplicação supletiva diferencia-se da aplicação subsidiária, ficando mais evidente a diversidade dos dois termos ao se comparar diretamente os dois:

Aplicar supletivamente é mais que subsidiariamente, e disso dá conta o próprio sentido de tais expressões: naquele caso, está–se a suprir a ausência de disciplina na lei omissa; a aplicação subsidiária por sua vez, é auxiliar, operando como que a dar sentido a uma disposição legal menos precisa (MEDINA, 2016, p. 82).

Ficando mais claro a diferenciação quando se demonstra através da prática jurídica essa diferenciação:

Quando uma lei simplesmente é omissa em relação a uma situação concreta, é preciso suprir essa lacuna normativa, por meio de utilização supletiva de outra lei. Por outro lado, quando existe texto normativo para o caso, mas a sua aplicação não conduz a um resultado adequado, pode-se falar em subsidiariedade. (FREIRE; SCHMITZ, 2016, p. 74).

Doutrina minoritária diverge dando conceituações inversas a comparação supletiva e subsidiária, entendo que:

Aplicação supletiva não se confunde com aplicação subsidiária. Está se dá na ausência de disposição normativa específica. Já quando se fala e aplicação supletiva, o que se tem é uma interação entre a lei específica e a lei geral (que, no caso em exame é o CPC), de modo que será necessário interpretar a lei específica levando-se em consideração o que conta na lei geral (CÂMARA, 2016, p. 24).1

Mesmo com a não unanimidade dos conceitos aplicados ao artigo 15 do CPC 2015, a máxima a que se pode chegar com as várias doutrinas apresentadas é que “[…] não será possível, portanto, interpretar as disposições processuais da legislação eleitoral ou da Consolidação das Leis do Trabalho sem levar em consideração o Código de Processo Civil” (CÂMARA, 2016, p. 24).

Podendo-se concluir que “[…] o novel Código transforma o processo civil e, por conseguinte, altera igualmente as lides eleitorais, ‘supletiva e subsidiariamente’, por expressa disposição normativa” (FERREIRA; MEZZAROBA, 2016, p. 381).

De forma inovadora em relação ao CPC 1973, o capítulo I do CPC 2015(artigos 1º a 12) trata “Das Normas Fundamentais do Processo Civil”, que não aplica apenas à matéria cível. Os 12 primeiros artigos do CPC 2015 têm como objetivo “[…] enunciar as normas fundamentais que orientam a aplicação da disciplina processual por ele inaugurada” (REIS; SAMPAIO JÚNIOR; MATEUS, 2016, p. 21).

Nesse contexto, o novo CPC deixou clara a magnitude dos direitos fundamentais para toda a codificação processual, salientando-se a previsão da inafastabilidade do controle jurisdicional (art. 3º), da duração razoável do processo (art. 4º), da boa-fé objetiva (art. 5º), da colaboração (art. 6º), da igualdade (art. 7º), do contraditório (arts. 7º, 9º e 10), da proporcionalidade (art. 8º), da publicidade (art. 8º e 11) e da motivação das decisões (art. 11), direitos fundamentais que, em sua harmonização, conformam o direito fundamental ao processo justo. (PAIM, 2016b, p. 44).

A principal previsão dos princípios fundamentais é o artigo 1º do CPC 2015 que determina que “[…] a ordenação, a disciplina e a interpretação das normas processuais civis devem ser dar em conformidade com os valores e as normas fundamentais estabelecidas na Constituição da República Federativa do Brasil” (REIS; SAMPAIO JÚNIOR; MATEUS, 2016, p. 22), assim pode-se afirmar que deve ocorrer “[...] esta mesma irradiação constitucional para o processo eleitoral” (REIS; SAMPAIO JÚNIOR; MATEUS, 2016, p. 23).

O artigo 1º do CPC de 2015 deixa claro que “Um dos objetivos que se teve ao se elaborar este novo Código foi o de situá-lo, expressa e explicitamente, num contexto normativo mais amplo, em que a Constituição Federal ocupa o principal papel.” (WAMBIER et al., 2016a, p. 60).

As normas fundamentais do processo civil devem ser seguidas pela Justiça Eleitoral, em todos os seus graus de jurisdição, e a não observância geraria nulidades inquestionáveis (VIGLIAR, CHALITA, 2016, p. 161): “[…] embora se trate de uma previsão expressa para o Processo Civil, não se pode desconhecer que a positivação dos direitos fundamentais na parte geral do Código transcende o Processo Civil” (PAIM, 2016b, p. 41).

Os artigos 16 até o 538 do CPC 2015 tratam da teoria geral do processo civil:

[…] não se pode negar a relevância dos temas abordados na parte geral do novo CPC, merecendo salientar, a título de exemplo, as normas processuais civis; a função jurisdicional, com o estudo da jurisdição, da ação e da competência, os sujeitos do processo, em que são analisadas as partes, os procuradores, o litisconsórcio, a intervenção de terceiros, o juiz e os auxiliares da justiça; o Ministério Público, a advocacia pública e a defensoria pública; os atos processuais, com o estudo dos prazos e da comunicação dos atos, bem como das nulidades; a tutela provisória, com o desenvolvimento das tutelas de urgência, cautelar ou satisfativas, e da evidência; e a formação, suspensão e extinção do processo. (PAIM, 2016b, p. 44).

A teoria geral do processo civil não se confunde com a teoria geral do processo. A teoria geral do processo é apresentada como uma ciência a unificar todo o estudo processual em diversas esferas do direito, como processual civil, processual penal, processual tributário, etc. (DINAMARCO, 2005, p. 69).

4.3 Resolução 23.478/2016

A Resolução 23.478 de 16 de junho de 2016, foi gerada como uma tentativa do TSE de estabelecer diretrizes gerais para a aplicação do CPC de 2.015. A Resolução 23.478/2016 provêm da “[…] necessidade de disciplinar o novo CPC, como norma-geral reitora do processo a ser aplicada em caráter subsidiário e supletivo” (PELEJA JÚNIOR, 2016b, p. 55).

A questão do próprio TSE ter determinado por resolução a aplicação do CPC 2015 no âmbito da Justiça Eleitoral, traz o primeiro entendimento que resoluções são atos normativos que pressupõe a existência de lei, as chamadas resoluções executiva, entretanto no direito eleitoral por força do poder normativo (GONÇALVES JÚNIOR, 2016, p. 67-72) da Justiça Eleitoral “[…] há resoluções que fogem ao viés de execução da lei, e possuem nítido caráter normativo, porque prepondera uma atuação atípica. Nesses atos, o intuito é inovador, mas com a finalidade de bem regular as eleições” (PELEJA JÚNIOR, 2016b, p. 54).

O artigo 1º da Resolução 23.478, regula a aplicação das novas regras processuais, “[…] sendo taxativa em tratar tão somente em oito capítulos de temais pontuais, avocando a aplicabilidade e inaplicabilidade sobre os mesmos e deixando uma zona cinzenta sobre outros temas ali não abordados” (REIS; SAMPAIO JÚNIOR; MATEUS; 2016, p. 14).

O parágrafo único do referido artigo determina que “[…] as disposições contidas nesta Resolução não impedem que outras sejam estipuladas a partir da verificação de sua necessidade”, assim não se pode limitar a aplicação do CPC/2015 apenas no que foi estipulado na Resolução 23.478.

5 Direito Processual Civil Eleitoral

Existe parte da doutrina que vê com ressalva a ampla aplicação do CPC de 2015 ao direito processual eleitoral, “[…] o sistema eleitoral tem regras próprias e concebidas à tutela de um Direito Material com características e princípios específicos que impedem a automática aplicação subsidiária do CPC.” (JORGE, 2016b, p. 84).

Parte da doutrina afirma a existência de um “microssistema processual eleitoral” (COSTA, 2016, p. 31), entretanto manter esse microssistema fechado e isolado significa mantê-lo desconexo e afastado da Constituição Federal em vários pontos.

Assim não deve prevalecer a afirmação que o Direito processual eleitoral é uma codificação fechada que nela se encerra todas as soluções para as questões processuais eleitorais:

[…] apesar da existência das inúmeras normas que visam regular o processo jurisdicional eleitoral, as técnicas processuais espalhadas pelas referidas leis são insuficientes para resguarda a legitimidade do processo eleitoral, pois somente com os instrumentos postos à disposição na legislação processual civil é que se tornará possível garantir efetividade às decisões do Judiciário Eleitoral. (SILVA, 2016, p. 223).

Da aplicação do CPC “[…] não pode advir qualquer desnaturação do Direito Eleitoral e do seu processo, que possuem contornos principiológicos próprios e, muitas vezes, escopos, distintos em relação à maioria dos direitos materiais” (REIS; SAMPAIO JÚNIOR; MATEUS, 2016, p. 16).

Assim não prevalece a crítica de que a aplicação do CPC 2015 desfigura as características próprias ao direito processual eleitoral, pois essa aplicação “[…] deve ser realizada quando não houver afrontas às particularidades do processo eleitoral, que prima pela celeridade e ostenta a preponderância de proteção” (AGRA, 2016, p. 222).

Necessário se faz que o processo judicial eleitoral seja totalmente revisto com base no CPC 2015, atualizando assim a legislação processual eleitoral (apesar de existir uma base constitucional a maior parte da legislação processual eleitoral é infra-constitucional) com base na constituição federal, como por exemplo a aplicação dos princípios da não surpresa (art. 10 do CPC 2015), a nova questão da fundamentação da sentença (art. 11 do CPC 2015) entre outras.

Para que cada vez mais as eleições tenham efetividade e legitimidade, sendo representação da soberania popular, é necessário um aperfeiçoamento do processo civil eleitoral, que passe “[…] necessariamente pela estabilidade da legislação, com reflexo imediato na solidez da construção jurisprudencial” (PIMENTA, 2002, p. 123).

6 Conclusão

O presente trabalho vêm apresentar o direito processual civil como a solução para os problemas de instabilidade enfrentados pelo direito processual eleitoral. O Código de Processo Civil 2015 traz previsão expressa em que determina que ampla aplicação ao processo eleitoral, não apenas de forma.

Trazendo o direito processual civil como a base do direito processual não apenas quando há lacunas na lei eleitoral (supletivamente), mas sim com uma releitura de todos os institutos do processo eleitoral analisado agora sob a vigência do Código de Processo Civil 2015 (subsidiariamente).

A expectativa de um código processual eleitoral ou a reforma do código eleitoral (que é de 1965), alardeada como solução por parte da doutrina eleitoral, se tornou argumento falacioso, pois o processo civil já traz delimitado todos os institutos que o processo eleitoral precisa. Especialmente após o Código de Processo Civil de 2015 que consegue incorporar todos os princípios processuais previstos na Constituição Federal de 1988.

A aplicação do Código de Processo Civil 2015 como base para o Processo Eleitoral, ao contrário do que parte da doutrina alardeia, respeita as particularidades das questões eleitorais, em nenhum momento tornando ineficaz essa matéria que necessita de ritos céleres.

Assim o Processo Civil Eleitoral é a resposta à necessidade do Direito Eleitoral de uma ciência processual que tenha cientificidade e estabilidade como colunas de sustentação.

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Revista Brasileira de Direito, Passo Fundo, vol. 14, n. 1, p. 231-252, Jan.-Abr., 2018 - ISSN 2238-0604

[Recebido: Jun. 13, 2017; Aceito: Abr. 23, 2018]

DOI: https://doi.org/10.18256/2238-0604.2018.v14i1.1969

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