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Desafios do desenvolvimento sustentável
e os recursos naturais hídricos

Eduardo Henrique Hamel

Mestrando em Direito pela Faculdade Meridional – IMED.
E-mail: <
[email protected]>.

Leilane Serratine Grubba

Doutora e Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Professora do Programa de
Pós-Graduação
Stricto Sensu em Direito da Faculdade Meridional. Professora dos Programas de
Pós-Graduação
Lato Sensu da Faculdade Meridional e Universidade Nove de Julho. Professora dos Cursos
de Direito da Faculdade Meridional e Faculdade CESUSC. Professora da Escola Superior do Ministério
Público de Santa Catarina. Pesquisadora da Fundação Meridional.
E-mail: <
[email protected]>.

Resumo

O artigo tem por objeto o desenvolvimento sustentável do meio ambiente, com ênfase nos recursos hídricos, considerando-se a relação paradoxal entre a diminuição dos riscos ambientais e os interesses de desenvolvimento econômico e industrial. A partir da noção da complexidade, que percebe o ser humano como partir integrante do meio ambiental, o artigo propõe uma conscientização social para o estabelecimento de ações públicas que possibilitem a solução da problemática sobre o meio ambiente e sua sustentabilidade, com a diminuição dos riscos ambientais. O texto objetiva uma análise científica do desenvolvimento sustentável e da sustentabilidade dos recursos naturais, principalmente, hídricos. A partir do método dedutivo, problematiza-se como o desenvolvimento sustentável pode dirimir os riscos dos avanços da fronteira agrícola, utilizando, de maneira consciente, os recursos naturais, em especial os hídricos, na observância dos dispositivos da legislação. Diante disso, serão o artigo irá discutir formas de planejamento e gestão que possibilitam a preservação dos recursos hídricos e desenvolvimento sustentável.

Palavras-chave: Desenvolvimento sustentável. Desafios. Riscos. Recursos Naturais Hídricos.

1 Introdução

A necessidade de posturas firmes e estratégicas com o fim de diminuir os riscos ambientais no complexo1 equilíbrio que envolve os interesses econômicos e sociais, impõe estudos, conhecimentos e conscientização da sociedade, norteados pelo estabelecimento de ações públicas eficazes e ativas na solução da problemática sobre o meio ambiente.

Trata-se de uma concepção de complexidade ambiental, que ultrapassa a complexidade da natureza e/ou recursos naturais, representando as dimensões da vida humana e natural. Essa noção de complexidade permite a percepção do ser humano como parte integrante do meio ambiente no qual está inserido, possibilitando pensar a diminuição dos riscos ambientais.

De um lado, solidificam-se avanços da legislação ambiental, contemplando a proteção do meio ambiente, no fim precípuo de preservar áreas fundamentais para evitar a degradação da natureza e suas decorrências, por vezes danosas aos seres e ao meio em que vivem. Contudo, de outro lado, expõe-se o desenvolvimento industrial, produtivo, tecnológico, econômico e social, de forma acelerada, presente cada vez mais na sociedade moderna e atual.

A relação do homem com a natureza, no decorrer do tempo, tem mostrado risco ao meio ambiente, concorrendo para o início das ações de políticas que incluem o desenvolvimento sustentável. Os novos conhecimentos na área da ciência e da tecnologia têm levado o homem a explorar a natureza com fins comerciais, arriscando a sua própria sobrevivência. Ao mesmo tempo em que a postura antropocêntrica e o desenvolvimento industrial levam a uma exploração dos recursos naturais, a conscientização da finitude desses recursos conduz a uma noção paradoxal de desenvolvimento sustentável, que significa o desenvolvimento (com a extração dos recursos naturais), mas desde que se salvaguarde os recursos para as gerações atuais e futuras (sustentabilidade).

De acordo com Leff (2010), uma das principais causas da problemática ambiental encontra amparo no processo histórico que insere a ciência moderna e a Revolução Industrial. A ecologia demanda ao materialismo histórico para explanar a produção de valores como decorrência do que é produzido de forma natural. É necessário uma reestruturação no que tange ao conceito de valor, renda diferencial e forças produtivas para que o processo produtivo entre em consonância com o meio natural.

Nesse cenário, assinalam Pereira e Horn (2009: 57), os limites ambientais devem ser vistos como parâmetros para que se gere um novo modelo de desenvolvimento – sustentável. Esse modelo deve afastar a premissa de que desenvolvimento sustentável se resume à simples economia de recursos naturais. Logo, esses limites não podem ser entendidos como decorrentes da insuficiência natural dos recursos para o atendimento das necessidades humanas. Eles devem ser entendidos na percepção de que a falta de tais recursos conduz ao indevido e destrutivo relacionamento do homem com a natureza, principalmente, quanto à produção de bens econômicos.

Mais ainda, segundo Pereira e Horn (2009: 57), o saber científico deve extrapolar o estudo da relação entre produção econômica e esgotamento de recursos naturais, bem como oferecer posturas que possam levar à modificação de padrões de comportamento de consumo, com a adoção de tecnologias ecoeficientes para produtos ambientalmente sustentáveis. Isso sustenta a adoção de uma política de desenvolvimento ambiental socialmente correta.

Contudo, conforme revela Duarte (2009), esse modelo de desenvolvimento ainda não foi implementado como desejado por seus articuladores, não sendo capaz de diminuir ou frear a degradação ambiental do Planeta, para cujo fim foi estabelecido. Diante disso é que chegar a um desenvolvimento sustentável e equitativo tem sido o maior desafio da sociedade em geral. Nessa senda, as legislações, através de seus textos, têm dispostos regramentos sobre um meio ambiente ecologicamente equilibrado, em especial, a Constituição Federal de 1988 (CAMPOS JÚNIOR, 2007).

A partir das considerações acima delineadas, o texto desta pesquisa tem como objetivo a análise científica do desenvolvimento sustentável e da sustentabilidade dos recursos naturais e, principalmente, hídricos. Diante disso, problematiza-se como o desenvolvimento sustentável pode dirimir os riscos dos avanços da fronteira agrícola, utilizando, de maneira consciente, os recursos naturais, em especial os hídricos, na observância dos dispositivos da legislação.

Considerando como ideologicamente equilibrada a gestão sustentável dos recursos hídricos, conforme será discutido no decorrer deste texto, serão apresentados modos que teoricamente tornam possível a sustentabilidade dos recursos hídricos, principalmente a partir de uma gestão integrada. Nesse sentido, serão mostradas formas de planejamento e gestão que possibilitam a preservação dos recursos hídricos e o desenvolvimento sustentável.

2 O desenvolvimento sustentável e o meio ambiente

Consolidado pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD), o desenvolvimento sustentável firma-se a partir das atenções e cuidados com o meio ambiente. Essa comissão, instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 19872, inseriu a elaboração de um teor declaratório universal sobre a proteção ambiental e o desenvolvimento sustentável, chamada de Relatório Brundtland. Esse documento trouxe, no seu bojo, a integração da questão ambiental no cenário econômico e pontuou a necessidade de uma nova forma de progredir, em uma resposta para a humanidade frente à crise social e ambiental que o mundo vivenciava a partir da segunda metade do século XX (CMMAD, 1991, p. 29).

O Relatório de Brundland – nosso futuro comum – prescreveu que a humanidade deveria preservar os recursos naturais, tornando concreto o conceito de desenvolvimento sustentável. Segundo esse conceito, os recursos naturais podem ser utilizados, mas também devem ser resguardados para as gerações futuras, a partir da noção de equidade geracional.

Nunes (2006, p. 37) assinala que o conceito de desenvolvimento sustentável traduz-se a partir de um ingrediente inovador, ao incluir as gerações que estão por vir como titulares de direito de viver em um meio ambiente equilibrado e de desenvolvimento saudável. Nesse cenário, somam-se elementos como o crescimento econômico, a satisfação de necessidade e a preservação dos recursos naturais no presente e para as gerações futuras, norteando a definição do desenvolvimento sustentável, cuja finalidade é conciliar o atual modelo de produção (e consumo) com a preservação ambiental.

Assim, ao compor o homem e a natureza em um mesmo tom, a qualidade vida das pessoas, na visão de Nunes (2006), assume-se como componente essencial na caracterização do desenvolvimento sustentável. Nesse sentido, alia-se a necessidade econômica e industrial do desenvolvimento e consumo à urgente necessidade de preservação ambiental, considerando-se tanto as gerações atuais quanto as vindouras.

No entanto, esse somatório de possibilidades não representa, na sua essência, atingir o desenvolvimento sustentável. As preocupações com os recursos naturais e o meio ambiente sociedade são realidades que começam a se impor. Duarte relata que, foi na sociedade industrializada que se principiaram as preocupações e “reações contra a sociedade de abundância e de consumo”. Em decorrência, a efetivação de sensibilizações no que tange ao meio ambiente motiva a atenção sobre

[...] a relação do homem com a natureza, com os limites ecológicos e sociais do desenvolvimento econômico. Desse modo, surgiu a noção do limite do crescimento econômico, que denunciou o crescimento exponencial da população, da degradação humana e ambiental, do consumo e do uso incontrolado dos recursos naturais (2009, p. 169).

Essa denúncia sobre a degradação humana e ambiental teve contribuição efetiva para que atitudes fossem tomadas no sentido de alertar sobre o descontrole na utilização dos recursos da natureza. Segundo expressa Duarte (2009), foi a partir dos anos 70, do século XX, que surgem informações sobre o esgotamento dos recursos que o meio ambiente fornece, afetando a qualidade de vida, em geral, nos países industrializados. Nesse contexto, propostas vêm à tona por um modelo de desenvolvimento sustentável.

Mas além de afetar a qualidade de vida nos países industrializados, o primeiro Relatório de Desenvolvimento Humanos, das Nações Unidas (1990), reconheceu a existência da injustiça ligada à degradação ambiental (alterações climáticas, etc.), afirmando que a maior parte do sofrimento cabe aos mais pobres. Entendeu-se que a degradação ambiental faz derivar efeitos a todos os humanos. Contudo, excetuados os grandes impactos locais, como aqueles causados por terremotos, concluiu-se que os efeitos mais devastadores, a longo prazo, recaem sobre as populações mais empobrecidas, que detém os menores recursos econômicos para a manutenção da vida digna após os danos ambientais, além de não terem acesso à tecnologia e poder suficiente para se precaver aos danos.

Novamente em 1994, o Relatório de Desenvolvimento Humano discutiu a segurança ambiental. Além disso, em 1992, ocorreu no Brasil uma das maiores Conferências das Nações Unidas sobre o tema do meio ambiente, que resultou em documentos importantes, a exemplo da Declaração do Rio, na qual estão contidos os princípios ambientais (NAÇÕES UNIDAS, 1992). No ano de 2012, ademais, durante o evento Rio + 20, que comungou os vinte anos transcorridos da Declaração do Rio (1992), buscou-se analisar os retrocessos e avanços ambientais, bem como delimitar o futuro.

Apesar dos grandes esforços a nível mundial e nacional, as ações empreendidas em nome do desenvolvimento sustentável apresentam-se de modo fragmentado frente aos desafios concernentes à questão ambiental.

Expõe Nunes (2006) que o capitalismo enverga um modelo econômico que não comporta o desenvolvimento satisfatório. Nesse pensamento, enquanto não for revisto e reestruturado o modelo econômico adotado mundialmente, torna-se inviável atingir desenvolvimento satisfatório bem como a sustentabilidade. Na sua forma, o capitalismo apresenta um modelo econômico em busca de expansão definitiva. Já a sustentabilidade pretende corrigir as desigualdades regionais e globais, visualizando a qualidade de vida humana no presente e no futuro.

Evidencia Duarte (2009) que o mundo contemporâneo tem mostrado um modelo de insustentabilidade, gerando problemas ambientais complexos que não configuram solução sem uma visão consciente dos governantes junto à sociedade. Nessa esteira de problemas, torna-se imprescindível garantir a manutenção e melhoria das bases que pautam a conservação da vida, pois não há como proteger e conservar o meio ambiente, após terem sido saturados os recursos naturais, os quais, por sua vez, devem assegurar a produção dos bens de consumo tão importantes às necessidades das demandas da sociedade no seu todo.

Corrobora Teixeira (2006), assinalando que a sociedade vivencia uma prática de insustentabilidade, uma vez que os recursos ambientais mostram-se cada vez mais escassos, concorrendo para que, apenas as atuais gerações possam desfrutar dos meios que a natureza oferece. Portanto, importa a efetivação de uma política de conservação, pois após a degradação total do recurso ambiental pouco poderá ser feito sobre a preservação. Na verdade, o desenvolvimento sustentável deve contemplar uma organização, cujo objetivo precípuo seja o cuidado da natureza para o usufruto das futuras gerações. Nessa senda, o meio ambiente ecologicamente equilibrado inclui o comprometimento de toda a sociedade, em práticas que aliem a comunidade e o Poder Público.

A sustentabilidade, por sua vez, vai mais além dos destinos da espécie humana, ou seja, atinge a perpetuação da vida e o valor intrínseco da criação ou do mundo natural. Observa Grassi que paira

[...] a consciência de que o progresso a qualquer preço não é sustentável a longo prazo, passando-se a defender a tese de que o desenvolvimento que atende às necessidades do presente deve prever a capacidade de as futuras gerações também terem meios de subsistência. Por outras, pretende-se melhorar a qualidade da vida humana dentro da capacidade que os ecossistemas possam suportar (1995, p. 16).

O desenvolvimento sustentável deve perceber a proteção do ambiente como parte integrante do processo de desenvolvimento, não podendo ser considerado de forma isolada. Importa, por conseguinte, perceber a complexidade ambiental. A partir de uma noção antropocêntrica, significa que os efeitos ecológicos repercutem sobre a vida humana, em sua conservação reprodução e evolução. Dessa forma, parece ser possível afirmar que não pode haver desenvolvimento que não seja sustentável.

3 O desenvolvimento econômico e o meio ambiente

A problemática ambiental – a degradação do meio ambiente –, conforme Leff (2006, p. 58), surgiu ao final do século XX. Sob a nomenclatura crise da civilização, a problemática ambiental se refere a um questionamento da racionalidade econômica e tecnológica dominantes.

As práticas produtivas, ao longo dos anos, parecem ter dependido do meio ambiente local e das estruturas sociais de uma dada cultura. Essas práticas ampliaram-se com o advento da globalização do capital e das informações tecnológicas às diversas culturas. Nesse sentido, segundo Leff:

A forma particular de articulação das determinações do ecossistema, a língua, a cultura, um modo de produção são específicos de cada formação social. A conformação de seu meio ambiente, a história de suas práticas produtivas e sociais, seus intercâmbios culturais na história determinaram a capacidade produtiva dos ecossistemas, a divisão do trabalho, os níveis de autoconsumo e a produção de excedentes comercializáveis. A intervenção mais ou menos forte do capital e dos Estados nacionais modificam estas modalidades de transformação do meio ambiente e dos estilos culturais pela introdução de novas técnicas e modelos produtivos. Isto transforma as formações sociais não-capitalistas em objetos complexos que se definem pelas indeterminações entre processos naturais, técnicos e culturais. (LEFF, 2006, p. 52-53).

Se, por um lado, a mencionada crise pode ser explicada pela pressão exercida em razão do crescimento populacional sobre os limitados recursos naturais, por outro lado, ela também pode ser explicada a partir de outra ideologia, ou seja, como o efeito da acumulação desenfreada do capital e da maximização da taxa de lucro, que induzem a padrões tecnológicos de uso e ritmos “[...] de exploração da natureza, bem como formas de consumo, que vêm esgotando as reservas de recursos naturais, degradando a fertilidade dos solos e afetando as condições de regeneração dos ecossistemas naturais” (LEFF, 2006, p. 189).

A conservação do meio ambiente em crise tem sua origem a partir da efetivação do capitalismo e evolução industrial. Expressa Campos Júnior (2007) que esses fatores contribuíram, de forma significativa, no desrespeito ao ambiente, construindo um modelo industrial que vem agredindo o ambiente ecológico, no decorrer dos anos. Neste século, o maior erro reside em buscar e manter

[...] o equilíbrio entre o desejado desenvolvimento econômico e a preservação da sadia qualidade de vida. A preservação do meio ambiente leva atualmente todas as sociedades do planeta a uma mudança drástica das grandes referências que marcaram os modelos de desenvolvimento econômico. A degradação ambiental e o quase esgotamento dos recursos naturais exigem uma mudança das políticas globais e o estabelecimento de um novo paradigma tecnológico e econômico (CAMPOS JÚNIOR, 2007:127).

Essas políticas devem, ao mesmo tempo em que priorizam o crescimento econômico, pautar-se por ações que possam coibir as agressões prováveis ao meio ambiente. Nesse contexto, Morato Leite (2003) revela que as ideologias liberais e socialistas ignoraram a crise ambiental, observando o capitalismo industrialista, primeiramente, e o coletivismo industrialista. Dessa forma, firmou-se uma opção por um modelo industrial agressivo aos valores ambientais da comunidade, traduzindo uma saturação dos moldes de desenvolvimento econômico e industrial experimentados. Ou seja,

[...] este divórcio entre a concepção de atividade econômica e ambiente é, pois, uma incontestada crise ambiental. A problemática ambiental questiona os processos econômicos e tecnológicos que estão sujeitos a lógica de mercado, resultando em degradação do ambiente e prejudicando a qualidade de vida. Pelo que se pode depreender, a crise ambiental questiona a necessidade de introduzir reformas no Estado, incorporando normas no comportamento econômico e produzindo técnica para controlar os efeitos contaminantes, com o propósito de dissolver as externalidades sociais e ecológicas geradas pela racionalidade do capital (MORATO LEITE, 2003, p. 22).

Esses processos econômicos e tecnológicos concorreram para que o meio ambiente, aos poucos, fosse afetado na sua preservação. Nesse aspecto, Morato Leite (2003) indica propostas que, em um primeiro momento, inclui a economia do ambiente, fundamentada no cálculo econômico dos bens ambientais. Trata-se da busca do equilíbrio da economia quanto ao uso de um determinado bem e na aplicação de um valor para a preservação dos recursos ambientais.

Em outro momento, o autor mencionado dispõe sobre o desenvolvimento durável, sustentável e o ecodesenvolvimento, para a preservação da natureza pela atual geração, no intuito de não comprometer a escassez para a futura geração. Os resultados dessa proposta contemplam-se em uma justiça intergeracional, partindo da premissa de que uma geração não tem o direito de desperdiçar o que recebeu, bem como degradar e comprometer o direito da outra que está apor vir, no que diz respeito aos recursos ambientais.

Para Leff (2006, p. 193, 204, 208), importa apreender o ambientalismo como uma política do conhecimento, ou seja, um saber ancorado num projeto de reconstrução social da humanidade. Segundo ele, a solução viável da crise ambiental não pode ocorrer por meio de uma gestão racional da natureza, mas deve ter como princípio a compreensão do conhecimento humano do mundo e a forma como esse saber se materializa na realidade.

A grande premissa para esse pensamento de Leff é a de que o ambiente é o todo, no qual se situa a natureza, mas também os humanos. Nesse sentido, é uma estrutura socioecológica que comporta as bases ecológicas da sustentabilidade. Isso significa a não redimensionalização da questão ambiental para a ordem econômica do desenvolvimento, mas sim a construção de um desenvolvimento humano e de um desenvolvimento produtivo sustentável, a partir das diversidades culturais.

Nesse entendimento, Leff (2010) assinala, entretanto, que edificar uma racionalidade produtiva como alternativa exige a transformação das condições econômicas, tecnológicas e políticas que estabelecem as formas que dominam a produção. O ecodesenvolvimento e suas estratégias atêm-se a determinadas ideologias teóricas, sendo delimitadas por paradigmas científicos que obstaculizam as reorientações sobre práticas produtivas para que se firme o desenvolvimento sustentável.

Ainda que o desenvolvimento econômico mostre-se essencial para a vida em sociedade, pois uma nação impõe-se com crescimento econômico, não há como olvidar a degradação ambiental como consequência. Nesse cenário, Campos Junior (2007) traz à tona o problema do desmatamento, quando se instalam as indústrias para cultivo das culturas:

[...] essa tomada de consciência recente pode ser verificada principalmente a partir da constatação de que as condições tecnológicas, industriais e as formas de organização e gestões econômicas da sociedade estão em conflito com a preservação ou a recuperação do meio ambiente ecologicamente equilibrado (2007, p. 127).

Os conflitos têm sido pauta tanto da gestão econômica como a da recuperação do meio ambiente. Isso revela a importância de ser criado um bom senso, pois segundo Fiorillo (2004), não há dúvida que o desenvolvimento econômico representa um valor precioso da sociedade, todavia aliado à preservação ambiental precisam, ambos, coexistirem, sendo que um não pode acabar com o outro.

Assim, mesmo diante do crescimento inevitável da economia, não há como esquecer a sustentabilidade de uma nação. Assinala Nunes (2006) que, nessa percepção, os problemas ambientais e econômicos demonstram-se intimamente ligados. A forma econômica globalizada tem buscado o progresso da sociedade, mas esquece do controle e equilíbrio ambiental. Esse procedimento conduz à degradação do meio ambiente. Reafirmando tal posicionamento, Duarte expressa que o sistema econômico, em seu formato globalizado, traduz-se por

[...] contínuos processos de extração, processamento e descarte de grandes quantidades de materiais, privilegiando a concorrência para a produção de valor e uma crescente pressão por modernização e conseqüente eficiência tecnológica, não se compatibiliza com a necessária e vital proteção e conservação dos recursos naturais que asseguram as bases de manutenção da vida (2009, p. 175).

Não se pode afirmar que existe, no mundo contemporâneo, uma efetiva compatibilização entre a tecnologia, em seus avanços, em consonância com devida proteção do meio ambiente. Portanto, Milaré (2014) alerta que é fundamental a harmonização do meio em que vivem os cidadãos com o desenvolvimento, tendo claro que os problemas ambientais precisam ser percebidos a partir de um processo contínuo de planejamento, para adequar as exigências de ambos. Nesse aspecto, importa observar as interrelações particulares a cada cenário sociocultural, político, econômico e ecológico, dimensionando-as no tempo e espaço.

Como patrimônio das atuais e futuras gerações, o meio ambiente insere-se na vida dos entes em sociedade. Essa perspectiva, conforme assinala Milaré (2014) condiciona os países, assim como o Brasil, a gerar riquezas para enfrentar os desafios da mudança social, como o crescimento populacional e as necessidades estruturais, de forma planejada e sustentável, para poder assegurar a compatibilização do desenvolvimento econômico e social articulado à proteção da qualidade ambiental. Essa garantia implica condição para que o progresso se sustente em função de toda a sociedade e não à custa do mundo natural.

Nessa compreensão, Fiorillo contribui afirmando que “a busca e a conquista de um ‘ponto de equilíbrio’ entre o desenvolvimento social, o crescimento econômico e a utilização dos recursos naturais exigem planejamento territorial que tenha em conta os limites da sustentabilidade” (2004, p. 25).

Barral e Pimentel (2006), em seus estudos, assinalam a preocupação inserida no princípio sustentável sobre ações racionais que preservem os processos e sistemas essenciais à vida e manutenção do equilíbrio ecológico. Para isso, torna-se necessário pensar em construir uma sociedade mais sustentável, socialmente justa e ecologicamente equilibrada. A compatibilização entre a utilização dos recursos naturais e a conservação do meio ambiente concretiza-se por meio de formas de produção que possam satisfazer as necessidades do ser humano, sem destituir os recursos essenciais às futuras gerações (equidade intrageracional e intergeracional).

Motta (2006) esclarece que um recurso ambiental mostra o seu valor econômico quando se institui a partir do bem-estar das pessoas devido às mudanças na quantidade de bens e, na apropriação por uso ou não. Essa percepção de valor econômico, na busca do desenvolvimento sustentável, está presente, no Brasil, principalmente, no tocante às políticas de gerir os recursos hídricos.

4 O desenvolvimento sustentável e riscos em relação aos recursos hídricos

Os recursos hídricos, pensados como recursos naturais, parecem ser das mais urgentes preocupações da modernidade no que tange à sua finitude e necessidade de preservação. Pontuam Carvalho e Rodrigues (2004) que, dentre as definições e objetivos que justificam a expressão desenvolvimento sustentável, inclui-se o gerenciamento dos recursos oriundos da natureza, tal como os recursos hídricos.

Para Theodoro et al. (2002), a água, como recurso hídrico, mostra-se como natural renovável. Contudo, pode ser extinta, a partir do impacto de práticas socioeconômicas que concorrem para a sua degradação, decrescendo a sua quantidade de uso em curto tempo e intervalos. Essa ação de degradar ameaça a segurança ambiental ao indicar risco à escassez da água doce, havendo a necessidade de modificar o padrão de vida dos agrupamentos.

Scantimburgo (2011) elenca considerações de pesquisadores e órgãos internacionais, que alertam que, desde meados do século passado, a água motiva bastante inquietação por parte da sociedade. O crescimento do acesso da população, somado à degradação da água doce, têm trazido preocupação e interesse dos governos e das agências multilaterais no que se refere ao gerenciamento e necessidade do controle dos recursos hídricos.

Nesse cenário, Nogueira (2006) afirma que a escassez no abastecimento de água pode se agravar em curto prazo. O Relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) de 2006, que trata de forma exclusiva sobre a problemática da escassez hídrica, alerta para os altos padrões de consumo que, em sendo mantidos, em 2025, em um cálculo aproximado, 3 bilhões de pessoas podem ter problemas de acesso à água potável. Números recentes revelam que cerca de 1,2 bilhões de pessoas não têm acesso à água de qualidade para consumo, somadas a 2,6 bilhões que não dispõem de coleta de esgoto de forma adequada. Por sua vez, os relatórios de 2007/08/09, espelham as mesmas previsões da ONU, chamando a atenção para que, em se mantendo a atual situação de mudança do clima, bem como aumento da população, proliferação de forma indiscriminada do lixo e mau uso dos recursos, a sociedade caminha para uma catástrofe.

Além disso, há que se salientar o paradoxo excludente do acesso à água, mesmo em tempo de pretensa abundância. Segundo o mencionado Relatório das Nações Unidas, de 2006, as pessoas da África Subsaariana, em condição de pobreza, pagam mais pelo acesso e uso da água potável que os residentes de cidades do Primeiro Mundo, como Nova Iorque. De fato, atualmente, enquanto 1 bilhão de pessoas não têm acesso à água, utilizando 5 litros de água por dia – calcula-se que deveria ser utilizado 20 litros de água para a manutenção das necessidades básicas –, em média, na Europa, cada pessoa utiliza diariamente mais de 200 litros e, nos Estados Unidos, mais de 400 litros.

Completa Nogueira (2006), assinalando que, mesmo que a ONU indique o consumo e o aumento da população como os principais vilões pela situação que se avizinha, importa destacar o papel do sistema político e econômico, configurado nas grandes corporações, no trato com a água. Há quarenta anos, os alertas primeiros da comunidade internacional já sinalizavam sobre o problema dos recursos naturais do planeta. No entanto, as medidas efetivadas não surtiram muitos efeitos.

Nogueira refere que “a água do planeta Terra não vai acabar e não está diminuindo. Apenas aquela que se pode recolher com a mão em concha para beber é que está ficando um pouco escassa pela imprudência humana, de não preservá-la” (2006, p. 22). A situação problemática da água, na verdade, não reside na sua escassez, e sim nas ações e práticas do homem com os recursos existentes, como poluição, apropriação da água por empresas privadas com finalidades econômicas e falta de serviços adequados de abastecimento e saneamento.

Os recursos naturais do Planeta são finitos e os impactos da sua utilização desenfreada são perigosos. A continuidade desse modelo de produção, extração e consumo deve ser questionada quanto à sua viabilidade a curto, médio e longo prazo.

Dados da Agência Nacional de Águas (ANA) revelam que o Brasil, em seu território, dispõe de 13,8% do total de águas doces superficiais do mundo, 34,9% do total de águas das Américas e 56,9%, no que tange à América do Sul (ANA, 2002).

Nesse contexto, áreas de preservação, que se encontram em florestas, devem ter sua conservação permanente, uma vez que são essenciais para que os recursos naturais não sejam afetados. Por determinação na legislação ou por ato declaratório, essas áreas, nos seus cuidados, são acolhidas nos artigos 1º, 2º e 3º3, do Código Florestal Brasileiro. Essas áreas de preservação, de acordo com Milaré, encontram-se

[...] em uma faixa de preservação de vegetação estabelecida em razão da topografia ou do relevo, geralmente ao longo dos cursos d’água, nascentes, reservatórios e em topos e encostas de morros, destinadas à manutenção da qualidade do solo, das águas e também para funcionar como “corredores de fauna” (2014, p. 169).

Os cuidados com a vegetação que se estabelece ao longo dos cursos d’água regulam-se também pela Lei n. 7.754 de 1989, quando considera como preservação permanente as florestas e demais formas de vegetação natural que surgem das nascentes dos rios. Explana Milaré que esse espaço objetiva “preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico da fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas” (2014, p. 169).

Campos Júnior, nesse sentido, destaca que as áreas que são de preservação e não de conservação, logo, não permitem “exploração econômica direta (madeireira, agricultura ou pecuária), mesmo com manejo” (2007, p. 170). Sua finalidade reside na proteção das águas e da qualidade do solo.

Em contribuição, o artigo 2º, da Resolução 302 do CONAMA, estabelece algumas definições:

[...] II - Área de Preservação Permanente: a área marginal ao redor do reservatório artificial e suas ilhas, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem estar das populações humanas; [...] (BRASIL, Resolução/02, 2015, p. 1).

Essas áreas, que podem ser chamadas de APPs, com vistas a garantir o bem estar das populações, têm um papel especial. Na visão de Campos Júnior (2007), sua excelência reside no equilíbrio do ecossistema com mecanismos compensatórios locais que devem conduzir a efetiva preservação ou também recuperação dos recursos naturais, fundamentais ao desenvolvimento sustentável. No ambiente rural, as APPs podem ser percebidas nas encostas acentuadas e matas ciliares, em áreas marginais de córregos, rios e reservatórios, e também, ao redor das nascentes. Muitos são os benefícios ao ambiente, como resultados da manutenção dessas áreas.

Quanto à produção sustentável, Campos Junior (2007) afirma que devem ser observadas as práticas de adoção de manutenção para que não ocorram impactos que possam afetar a sociedade. Por vezes, os recursos hídricos indisponíveis, em área urbana, devem-se à degradação de áreas de nascentes em várias bacias hidrográficas no Brasil.

Segundo aduz Machado, o Brasil, que dispõe de alto volume de água doce em relação à superfície mundial, é um país privilegiado, por ser o primeiro em disponibilidade hídrica em rios do mundo. No entanto, a poluição e o uso inadequado têm afetado esse recurso em várias regiões do país. Em 1997, a Lei 9.433 inaugura a Política Nacional de Recursos Hídricos e cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Com essa regulamentação, há uma modificação valorativa quanto aos “usos múltiplos da água, às prioridades desses usos, ao seu valor ético e econômico, à sua e a participação popular na sua gestão” (2014, p. 75). Assim, a mensuração da água

[...] dentro dos valores da economia. Isso não pode e nem deve levar a condutas que permitam que alguém, através do pagamento de um preço, possa usar a água a seu bel-prazer. A valorização econômica da água deve levar em conta o preço da conservação, da recuperação e da melhor distribuição desse bem (MACHADO, 2014, p. 75).

Na essencialidade de bem ambiental, a água, que deve ser cada vez mais valorizada e conservada, estabelece também esses critérios por meio da Constituição Federal, no artigo 2254, ao expressar a necessidade da defesa dos bens coletivos e a existência de um bem comum a todos.

Garcia (2006) revela que o cenário brasileiro não comporta mais águas de propriedade particular. As nascentes dispostas em uma propriedade privada como os rios que as limitam, são conceituadas pelo Código de Águas como comuns, sendo todas águas públicas.

Há necessidades essenciais do ser humano que estão na dependência do meio ambiente. Para Garcia (2006), os bens que integram o ambiente, como a água, o ar, o solo, devem satisfazer as necessidades de todos os humanos. Em sendo de uso dos recursos ambientais, o meio em que os seres vivem é bem de uso comum do povo.

Milaré esclarece que uma das normas que tratam da proteção do meio ambiente, através de uma política ambiental, determina-se pela cobrança pelo uso da água instituída pela Lei de Política Nacional de Recursos Hídricos, Lei Federal n. 9.433/97, especificamente, no artigo 19, ao referir que

[...] a cobrança pelo uso dos recursos hídricos objetiva: I – reconhecer a água como bem econômico e dar ao usuário uma indicação de seu real valor; II – incentivar a racionalização do uso da água; III – obter recursos financeiros dos programas e intervenções contemplados nos Planos de Recursos Hídricos (2014, p. 254).

Esses dispositivos, através da Lei 9.433, tornam a água um bem econômico, o qual traz motivação, segundo Garcia (2006), para a racionalização do uso desse bem natural, em valor próprio, uma vez que se contempla como um recurso essencial para o desenvolvimento sustentável do planeta.

Explana Garcia (2006) que, regulada pela Lei de 1997, a cobrança pela água condiz com valores monetários pelo uso dos recursos hídricos por quem detém a outorga nos direitos de utilizá-la. Isso ocorre contra que detém a água como meio de sua atividade econômica, e não contra o consumidor da prestação de serviços que incluem tratamento, abastecimento, coleta e esgotamento de dejetos. Logo, a devida cobrança estende-se aqueles que utilizam os recursos hídricos por meio de captação direta dos corpos d´água, inseridos em sua atividade econômica, ou daqueles que os usam em sua atividade econômica, como produtores rurais, companhias de abastecimento, empresas geradoras de energia elétrica, indústrias.

Garcia (2006) vai mais além e complementa, assinalando que cobrar pelo uso dos recursos hídrico compõe-se em um instrumento jurídico-econômico, de acordo com as decorrências negativas que o usuário da água possa causar. Esse recurso hídrico, atualmente, trata-se de um bem escasso, visto que devido à poluição e carência de tratamento efetivo tem sido pouco abundante. Logo, cobrar pelos recursos hídricos configura

[...] o princípio da “internalização” dos custos ambientais por aqueles que se aproveitam dos recursos naturais, em geral, e, especialmente, das águas. Hoje, esses custos são “externalizados”, vale dizer, são pagos por toda a sociedade, inclusive por quem não se aproveita do recurso natural. Por outro lado, quando a sociedade não paga esses custos econômicos paga-os com a degradação da qualidade ou da quantidade do recurso usado (MILARÉ, 2014, p. 402).

Essa externalização de custos que se estende a toda sociedade é resultado da degradação desse recurso, que é água. Por isso, o gerenciamento dos recursos hídricos deve ser visto como uma prática adotada na sua preservação.

A revisão de Mota (2008) destaca que esse gerenciamento implica na aplicação de medidas estruturais e não estruturais para que se ative o controle dos sistemas hídricos naturais e artificiais, com o fim de beneficiar as populações e atender os objetivos ambientais. A ANA, como o órgão federal responsável pela implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, deve se articular com os demais órgãos e entidades públicas e privadas que se inserem no Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, com ações e práticas que busquem soluções adequadas à poluição dos rios.

Assevera Mota (2008) que algumas medidas de prevenção do controle da poluição da água acolhem critérios com exigências para o lançamento de efluentes em corpos de água, como: implantação de sistema de coleta e tratamento de esgoto; coleta e destino adequado dos resíduos sólidos; controle do uso de fertilizantes e pesticidas; reuso da água e disciplina no uso e na ocupação do solo.

Salati et al. sugerem práticas que devem ser consideradas para atingir a sustentabilidade dos recursos hídricos, além de melhorar a oferta atual de água em qualidade e quantidade. Para tal, é importante

[...] aprofundar os estudos científicos e tecnológicos sobre os recursos hídricos do país, tanto para águas superficiais como subterrâneas; estabelecer mecanismos que permitam um aprimoramento contínuo e constante da legislação face à realidade da gestão da demanda e da oferta de recursos hídricos; aprimorar a estrutura institucional envolvida no manejo, utilização e fiscalização dos recursos hídricos; fazer com que os projetos que envolvem o manejo de recursos hídricos levem em consideração suas influências e interações com outros setores do meio ambiente e da sociedade; estabelecer facilidades para a formação de recursos humanos na ciência e na técnica de preservação e utilização dos recursos hídricos (2006, p. 38).

As sugestões elencadas podem contribuir para que se pratique a sustentabilidade dos recursos hídricos, na forma de uma gestão integrada que, na acepção de Rebouças (2006), deve obedecer a uma linha que mostre a necessidade de descentralização do processo decisório, e não apenas ações, que mostrem as diversidades e peculiaridades físicas, sociais, econômicas, culturais e políticas, sejam regionais, estaduais e municipais ou de unidades hidrográficas críticas.

A visão de Marotta et al. (2008) considera que a demanda pela gestão sustentável dos recursos hídricos tem se mostrado ideologicamente adequada. Isso tem-se revelado em modelos de planejamento e por gestão sob uma percepção capitalista que objetiva a reprodução em um prazo maior do modelo produtivo e de seus agentes, sob uma perspectiva que prevê a diminuição das injustiças sociais e a melhora da qualidade de vida dos cidadãos.

Assim sendo, os recursos hídricos, com suas possibilidades e riscos de escassez, necessitam ser administrados e monitorados de uma maneira que possam sustentar ações firmadas na utilização com preservação e ser sustentável.

5 Considerações Finais

O artigo teve por objeto de pesquisa a problemática ambiental dos recursos hídricos e objetivou analisar, cientificamente, o desenvolvimento sustentável e a sustentabilidade dos recursos naturais, especialmente os recursos hídricos. Diante do tema proposto, o texto problematizou como o desenvolvimento sustentável pode dirimir os riscos dos avanços da fronteira agrícola, utilizando, de maneira consciente, os recursos naturais, em especial os hídricos, na observância dos dispositivos da legislação.

Para responder à problematização proposta e, considerando como ideologicamente equilibrada a gestão sustentável dos recursos hídricos, se discutiu os modos teóricos possíveis de garantir a sustentabilidade dos recursos hídricos, principalmente a partir de uma gestão integrada. Nesse sentido, toda a argumentação se encontra no âmbito da concepção de complexidade ambiental, que permite pensar o ser humano como parte integrante do meio ambiente no qual está inserido e, consequentemente, a diminuição dos riscos ambientais.

Diante disso, em primeiro lugar, abordou-se a ideia do desenvolvimento sustentável, conceituando-o como a possibilidade de utilização (produção e consumo) consciente e sustentável de um meio ambiente equilibrado, levando em consideração as gerações atuais e vindouras. O desenvolvimento sustentável, nesse sentido, deve perceber a proteção do ambiente como parte integrante do processo de desenvolvimento, não podendo ser considerado de forma isolada.

Em segundo lugar, analisou-se a relação entre o desenvolvimento econômico e o meio ambiente. Considerando o valor econômico do recurso ambiental a partir do bem estar das pessoas, não somente em razão do valor de extração e consumo, pode-se falar de sustentabilidade no desenvolvimento.

Por fim, abordou-se especificamente a ideia do desenvolvimento sustentável com relação aos riscos ligados aos recursos hídricos – a água –, entendendo-os como uma das mais urgentes preocupações da modernidade, no que tange à finitude e necessidade de preservação. Nesse sentido, conclui-se que a gestão sustentável dos recursos hídricos tem se mostrado ideologicamente adequada, principalmente em modelos de planejamento e por gestão sob uma percepção
capitalista que objetiva a reprodução em um prazo maior do modelo produtivo e de seus agentes, sob uma perspectiva que prevê a diminuição das injustiças sociais e a melhora da qualidade de vida dos cidadãos.

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Challenges of sustainable development and water resources

Abstract

The article focuses on the sustainable development of the environment, with emphasis on water resources, considering the paradoxical relationship between the reduction of environmental risks and the interests of economic and industrial development. From the notion of complexity, which perceives the human being as a member of the environmental, the article proposes a social awareness for the establishment of public actions to enable the solution for the problem concerning the environment sustainability, with the reduction of environmental risks. We aim a scientific analysis of sustainable development and sustainability of natural resources, especially water. From the deductive method, it discusses as sustainable development can resolve the risks of the advances of the agricultural frontier, using, consciously, natural resources, especially water, in compliance with the legislation devices. Therefore, the article will discuss ways of planning and management that enable the conservation of water resources and sustainable development.

Keywords: Sustainable Development. Challenges. Risks. Water Resourses.

Submissão: 22/02/2016

Aprovação: 21/05/2016

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1 A categoria complexidade advém do termo complexus, que é “[...] o que está junto; é o tecido formado por diferentes fios que se transformam numa só coisa. Isto é, tudo isso se entrecruza, tudo se entrelaça para formar a unidade da complexidade; porém, a unidade do complexus não destrói a variedade e a diversidade das complexidades que o teceram”. (MORIN, 2010. p. 108 e 188).

2 Ressalta-se que, já nos anos 60 do século XX, surgiu um ecologismo que evidenciou a necessidade de proteção efetiva, para além da mera conservação da natureza. Como exemplo desse ecologismo, o livro Primavera silenciosa (1962), de Carson, investigou os impactos do uso intensivo de agrotóxicos na agricultura, no meio ambiental e para a saúde humana.

3 Art. 1º Esta Lei estabelece normas gerais sobre a proteção da vegetação, áreas de Preservação Permanente e as áreas de Reserva Legal; a exploração florestal, o suprimento de matéria-prima florestal, o controle da origem dos produtos florestais e o controle e prevenção dos incêndios florestais, e prevê instrumentos econômicos e financeiros para o alcance de seus objetivos.

Parágrafo único. Tendo como objetivo o desenvolvimento sustentável, esta Lei atenderá aos seguintes princípios:

I - afirmação do compromisso soberano do Brasil com a preservação das suas florestas e demais formas de vegetação nativa, bem como da biodiversidade, do solo, dos recursos hídricos e da integridade do sistema climático, para o bem estar das gerações presentes e futuras; [...].

Art. 2º As florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação nativa, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem [...]

Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por:

I - Amazônia Legal: os Estados do Acre, Pará, Amazonas, Roraima, Rondônia, Amapá e Mato Grosso e as regiões situadas ao norte do paralelo 13° S, dos Estados de Tocantins e Goiás, e ao oeste do meridiano de 44° W, do Estado do Maranhão;

II - Área de Preservação Permanente - APP: área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas; [...] (BRASIL, Lei n. 12.651, 2012).

4 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações (BRASIL, Constituição de 1988, 2013).

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