Alice no país da democracia, ou através do espelho parlamentar da jurisdição constitucional: um diálogo com o professor Eduardo Mendonça sobre o neotribunado da plebe / Alice’s adventures in democracy land, or through the parliamentary looking glass of judicial review: a dialogue with professor Eduardo Mendonça about the neoplebeian tribune.

Thiago Aguiar Pádua

Resumo


RESUMO

Este artigo busca dialogar com recentemente artigo publicado pelo professor Eduardo Mendonça, no qual expõe a percepção de que o desgaste da representação político-parlamentar daria lugar a uma atuação do Supremo Tribunal Federal como representante da opinião pública. Discordamos de sua construção teórica a partir de recurso metodológico da argumentação jurídica. Realizamos análise sobre dois documentos contextualizados de nossa historiografia constitucional, advindos as vésperas de dois períodos de exceção, e que também se fundamentavam no mesmo desgaste da representação político-parlamentar: 1) missiva escrita por Monteiro Lobato em 1924 ao presidente Artur Bernardes, e, portanto, as vésperas da revolução de 1930; e, 2) artigo-manifesto escrito por Goffredo Telles Jr em 1963, e assim sendo, as vésperas do golpe de Estado Civil-Militar de 1964. Articulamos discussão de premissas, utilizando o pensamento do jurista e sociólogo argentino Roberto Gargarella, discutindo as causas do desgaste da representação político-parlamentar, constatando que tal desgaste decorre da forma como as instituições foram desenhadas, de maneira a afastar a cidadania das discussões políticas, por temor do fenômeno democrático. Concluímos constatando que ao invés de se realizar empoderamento de um agente decisório, de duvidosa conotação democrática como o STF, mais adequado seria estimular e fomentar o acesso da população à “Sala de Máquinas da Constituição”.

PALAVRAS-CHAVE: Desgaste da Representação Política; Suprema Corte; Opinião Pública; Sala de Máquinas da Constituição.

 

 

ABSTRACT

This article is a dialogue with a recently published article by the professor Eduardo Mendonça, which exposes perception that the erosion of political and parliamentary representation would result in a performance of the Supreme Court as a representative body of public opinion. We disagree with his theoretical construction, articulating the critique from methodological analysis of the legal argument. We also analysis two documents of our constitutional history, coming on the eve of two periods of exception, which also were based on the same argument of erosion of political and parliamentary representation: 1) The letter written in 1924 by Monteiro Lobato to President Artur Bernardes, and therefore short before the 1930’s revolution. 2) The article-manifest written by Goffredo Telles Jr in 1963 a few days before the 1964 Civil-Military coup d’état. We articulate a discussion of premises, using the thought of the argentine sociologist and jurist Roberto Gargarella, discussing the causes of the erosion of political and parliamentary representation, noting that such thing arises from the way the political institutions were designed, in order to depart citizenship of political discussions, for the fear of the democratic phenomenon. We conclude noting that instead of performing empowerment of a decision-making agent of dubious democratic connotation, as the Supreme Court, most appropriate would be to encourage and foster the population's access to “Engine Room of Constitution”.

KEYWORDS: Erosion of political and parliamentary representation; Supreme Court; Public Opinion; Engine Room of the Constitution.


Palavras-chave


Desgaste da Representação Política; Suprema Corte; Opinião Pública; Sala de Máquinas da Constituição.

Texto completo:

PDF HTML

Referências


ARAÚJO, António. A Construção da Justiça Constitucional Portuguesa: o nascimento do Tribunal Constitucional. Análise Social, quarta série, vol. 30, n. 134, 1995.

ARAÚJO, António. Para a história da fiscalização da constitucionalidade em Portugal: comentário acórdão de 23 de julho de 1907 Supremo Tribunal de Justiça. Revista Brasileira de Direito Constitucional, n. 2, jul./dez, 2003.

BALEEIRO, Aliomar. Constituições Brasileiras: 1891. 3. ed. Brasília: Senado, 2012. v. II.

BERNARDES, Artur. Carta do Presidente Artur Bernardes à Monteiro Lobato. In: Ferro e o Voto Secreto. São Paulo: Globo, 2010.

CARROL, Lewis. As Aventuras de Alice no País das Maravilhas & Através do Espelho e o que Alice encontrou por lá. Trad. Maria Luiza Borges. Rio de Janeiro: Zahar, 2009.

DAHL, Robert A. Decision-Making in a democracy: the Supreme Court as a national policy maker. Journal of Public Law, n. 6, 1957.

DAHL, Robert A. Tomada de Decisões em uma democracia: a Suprema Corte como uma entidade formuladora de políticas nacionais. Trad. Grupo Primacy Translations. Revista de Direito Administrativo, v. 252, 2009.

DWORKIN, Ronald. Direitos fundamentais: a democracia e os direitos do homem. In: DARTON, Robert; DUHAMEL, Olivier. Democracia. Trad. Clovis Marques. Rio de Janeiro: Record, 2001.

EAGLETON, Terry; BOURDIEU, Pierre. A Doxa e a Vida Cotidiana: uma entrevista. In: ŽIŽEK, Slavoj. Um Mapa da Ideologia. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Contraponto, 1996.

FERRAZ, Manuel M. de Figueiredo. Do Tribunado da Plebe. São Paulo: Editora Universidade de São Paulo, 1989.

FRIEDMAN, Barry. The Will of the people: how public opinion has influenced the Supreme Court and shaped the Constitution. New York: FSG, 2009.

GARGARELLA, Roberto. Crisis de la Representación Política. México-DF: Fontamara, 1997

GARGARELLA, Roberto. Em Nome da Constituição: O legado Federalista dois séculos depois. In: BORON, Atílio. Filosofia Política Moderna: De Hobbes a Marx. São Paulo: Clacso, USP, 2006.

GARGARELLA, Roberto. Theories of Democracy, the Judiciary and Social Rights. In: GARGARELLA, Roberto; DOMINGO, Pilar; ROUX, Theunis (Orgs). Courts and Social Transformation in New Democracies. An Institutional Voice for the Poor? Hampshire, Ashgate, 2006.

GARGARELLA, Roberto. La Justicia frente al Gobierno: Sobre el carácter contramayoritario del poder judicial. Quito: Centro de Estudios y Difusión del Derecho Constitucional, 2011.

GARGARELLA, Roberto. Latin American Constitutionalism (1810-2010): The Engine Room of the Constitution. New York: Oxford, 2013.

GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito e História: Uma Relação Equivocada. Londrina: Edições Humanidades, 2004.

GUILHERME MOTA, Carlos; LOPEZ, Adriana. História do Brasil: Uma Interpretação. 2. ed. São Paulo: Senac, 2008

IRWIN, William (Coord). Alice no País das Maravilhas e a filosofia: cada vez mais e mais curioso. Trad. Camila Zanon. São Paulo: Madras, 2010.

JOHANNESSEN, Finn-Henning. Alice in Wonderland: Development of Alice’s Identity within Adaptations. 2011. 91f. Dissertação de Mestrado em Literatura Inglesa – Department of Culture and Literature, Faculty of Humanities, Social Sciences and Education – University of Tromso, Tromso, Noruega, 2011.

KEANE, John. Vida e Morte da Democracia. São Paulo: Edições 70, 2010.

LAIN, Corinna Barret. Upside-Down Judicial Review. The Georgetown Law Journal, v. 101, 2012.

LOBATO, Monteiro. Carta ao Excelentíssimo Senhor Presidente Artur Bernardes. In: Ferro e o Voto Secreto. São Paulo: Globo, 2010.

MENDONÇA, Eduardo. A Jurisdição Constitucional como Canal de Processamento do Autogoverno Democrático. In: SARMENTO, Daniel (org.). Jurisdição Constitucional e Política. Rio de Janeiro: Forense, 2015.

NOGUEIRA, Octaciano. A Democracia que Terminou em Tragédia (prólogo), In: A Constituinte de 1946. Getúlio, o Sujeito Oculto. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

ORTROGORSKI, Moisei. La democracia y los partidos políticos. Trad. Antonio Lastra e Andrés Martos. Madrid: Trotta, 2008.

PÁDUA, Thiago Aguiar. A Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4650 e a “Democracia Guardiana” de Robert Dahl. Revista Brasileira de Políticas Públicas, 2015, no prelo.

PÁDUA, Thiago Aguiar; FERREIRA, Fábio Bragança. Entre o Tribunal e o Parlamento: a atualidade das lições dos casos de verticalização e fidelidade partidárias no contexto do papel das instituições na Reforma Política. Revista da AGU, 2015-2016, no prelo.

PORTO, Walter Costa. Dicionário do Voto. Brasília: Editora UnB, 2000.

POST, Robert; SIEGEL, Reva. Roe Rage: Democratic Constitucionalism and Backlash. Harvard Civil Rights-Civil Liberties Law Review, v. 42, 2007.

SEVERO, Alípio; NOGUEIRA, Octaciano. Democracia dos Autocratas. Brasília: Edições Dédalo, 2003.

SILVA, José Afonso da. O Constitucionalismo Brasileiro: evolução institucional. São Paulo: Malheiros, 2011.

TELES JR., Gofredo. Goffredo Telles Júnior dá a Público a Carta aos Brasileiros. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, v. 72, n. 2, 1977.

TELLES JR, Goffredo. Pronunciamento. Revista de Direito da Universidade de São Paulo, v. 63, 1969.

TELLES JR., Goffredo. Lineamentos de uma Democracia autêntica para o Brasil. Revista de Direito da Universidade de São Paulo, v. 58, 1963.

TELLES JR., Goffredo. Resistência violenta aos governos injustos. Revista de Direito da Universidade de São Paulo, v. 50, 1955

THACH JR., Charles C. The Creation of the Presidency: 1775-1789. Baltimore: The John Hopkins Press, 1969.

TUSHNET, Mark. Constitutional Hardball. The John Marshall Law Review, vol. 37, p. 523-553, 2004.




DOI: https://doi.org/10.18256/2238-0604.2017.v13i3.1014

Apontamentos

  • Não há apontamentos.