Judicialização da pandemia e os guidelines: autocontenção judicial no exame das escolhas trágicas envolvendo vagas em leitos de UTI realizadas por profissionais da saúde

Dirceu Pereira Siqueira, Marcel Ferreira dos Santos

Resumo


O presente artigo tem por objetivo investigar, sob o ponto de vista interdisciplinar – com base na ciência médica e jurídica –, um fato escancarado pela pandemia: a escassez de serviços de saúde, especialmente leitos de UTI, e os critérios de escolha de quem vive e quem morre (“escolhas trágicas”) utilizados diariamente por profissionais da área da saúde. Como problema de pesquisa, pretende-se discutir em que medida o Estado-Juiz deve, ou não, interferir nas escolhas trágicas realizadas pela equipe de triagem de unidades hospitalares com base em guidelines, no contexto de acesso à justiça. A judicialização da pandemia é um fenômeno natural decorrente do agravamento dos problemas experimentados pela nossa sociedade no contexto de uma crise sanitária atípica. A tomada de decisão sobre quem irá ocupar leitos de UTI em um quadro fático de escassez de recursos traduz uma “escolha trágica”. Ao judiciário é reservada, a princípio, uma postura de deferência em relação à ciência médica. Em situações pontuais, todavia, impõe-se a intervenção comedida com vistas a assegurar a própria eficiência macro do sistema. A pertinência temática da pesquisa está assentada no fato de a escassez de serviços de saúde ter atingido níveis alarmantes na pandemia. Como percurso metodológico, utilizar-se-á do método hipotético-dedutivo. Aventa-se como hipótese a ser corroborada ou refutada ao longo da pesquisa que o Poder Judiciário não é a instância adequada para resolução da falta de vagas em leitos de UTI. Como procedimento, objetiva-se o aprofundamento teórico por meio de pesquisa bibliográfica nas bases de dados da Scopus, EBSco, google acadêmico, sem olvidar protocolos de associações e entidades médicas nacionais e estrangeiras.


Palavras-chave


Judicialização da saúde; Guidelines; Escolhas trágicas; Direitos da personalidade; Autocontenção

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DOI: https://doi.org/10.18256/2238-0604.2021.v17i2.4553

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