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Relação entre Manipulação Amoral, Identificação Organizacional e Satisfação com a vida: Um Estudo com Gestores do Setor de Serviços

Relationship Between Amoral Manipulation, Organizational Identification and Satisfaction with life: A Study with Services Sector Managers

Márcia Marisa Sant Anna Perin(1); Lidiane Comin(2); Jandir Pauli(3)

1 Faculdade Meridional (IMED), Passo Fundo, RS, Brasil. E-mail: [email protected]

2 Universidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC), Joaçaba, SC, Brasil. E-mail: [email protected]

3 Faculdade Meridional (IMED), Passo Fundo, RS, Brasil. E-mail: [email protected]

Resumo

O objetivo deste estudo foi avaliar a relação entre a identificação organizacional e a manipulação amoral de gestores de empresas, a fim de testar essa relação com a satisfação com a vida. Para a realização deste, utilizou-se de uma survey com 188 participantes, por meio da Escala de Satisfação com a Vida (SWL), a Escala de Identificação Organizacional (EIO) e a Escala de Personalidade Maquiavélica (MPS), que abordam as dimensões necessárias para a investigação da problemática do estudo. Pelos resultados obtidos foi possível evidenciar que a influência da manipulação amoral na satisfação com a vida é negativa, na percepção dos pesquisados. Os comportamentos não éticos em que prevalecem as formas de trapacear os demais, não são vistos como satisfatórios para o alcance de uma vida boa ou desejada, justificando assim que “os fins não justificam os meios”. Por meio da testagem da variável moderadora identificação organizacional, evidenciou-se que quanto mais essa identificação é percebida pelo indivíduo, menos entendimento de manipulação amoral existe, aumentando assim a satisfação com a vida e confirmando o efeito moderador nesta relação.

Palavras-chave: Manipulação amoral, Identificação Organizacional, Satisfação com a Vida, Efeito moderado

Abstract

The objective of this study was to evaluate the relationship between organizational identification and amoral manipulation of company managers, to test this relationship to satisfaction with life. For achieving this, we used a survey with 188 participants through the Satisfaction with Life Scale (SWL), Organizational Identification Scale (EIO) and Personality Scale Machiavellian (MPS), addressing the dimensions required for research study problematic. From the results it became clear that the influence of amoral manipulation in satisfaction with life is negative, in the perception of respondents. Unethical behaviors prevalent forms of cheating others, they are not seen as satisfactory for the achievement of a lifetime good or desired, thus justifying that “the ends do not justify the means.” Through the testing of organizational identification moderating variable, it was evidenced that the more this identification is perceived by the individual, the less understanding there is amoral manipulation, thus increasing satisfaction with life and confirming the moderating effect on this relationship.

Keywords: Amoral manipulation, Organizational identification, Satisfaction with Life, Moderate effect

1 Introdução

Movida pelo impulso do progresso econômico e social, em busca de produzir bens e serviços para a satisfação das pessoas, a sociedade torna-se cada vez mais um sistema complexo de estruturas e processos organizacionais. Essas estruturas exercem influências que afetam o comportamento de pessoas, grupos e organizações, gerando uma identificação capaz de mobilizar diferentes comportamentos em busca de alcançar os objetivos, sejam eles, organizacionais, profissionais ou pessoais.

A evolução destes comportamentos tornou-os cada vez mais racional e por vezes mais coercitivo, diante da combinação da variável identificação com poder. Enquanto que a identificação busca socializar os valores e objetivos da organização em todos os seus níveis hierárquicos, o poder apresenta-se como um mecanismo de influência que afeta o comportamento por meio dos domínios relacionais (Jones & Volpe, 2011; Wieseke, Kraus, Ahearne, & Mikolon, 2012; Schaubroeck, Peng, & Hannah, 2013).

Questões éticas têm sido reconsideradas nos tempos hodiernos, tendo em vista os inúmeros escândalos envolvendo renomadas corporações, através do comportamento de seus gestores. Neste cenário, o presente estudo propõe a utilização de um construto, originalmente vindo da psicologia, para os estudos organizacionais, tendo em vista a relação direta entre a identificação dos indivíduos frente ao comprometimento e comportamento proativo com o Maquiavelismo. Através de sua obra, O Príncipe, Nicolau Maquiavel (1469, 1527), sugere ao soberano que seja tático, estratégico e que planeje friamente o futuro, sendo deste modo manipulador, pragmático e por vezes até imoral, justificando-se que “os fins justificam os meios”. Em um recente estudo relacionando materialismo, maquiavelismo e ética, Pekdemir e Turan (2015) evidencia a influência de Maquiavel no campo das ciências políticas atuais, considerando que os governantes são capazes de ignorar a sua ética e valores em busca de um governo mais bem sucedido do que aqueles que governam com sinceridade e honestidade.

Diante deste contexto, vislumbra-se a relevância deste estudo, no fato de que o maquiavelismo tem estreita relação com o comportamento humano, é determinado por avaliações positivas ou negativas da realidade, e externalizado através de atitudes. É através dessas avaliações que se mensura o grau de maquiavelismo do indivíduo, sendo este um construto de caráter individual (Trevino & Brown, 2004), mas que reflete diretamente no contexto organizacional uma vez que trata da relação entre High Machs e a identificação organizacional.

Estudos apontam (Ashforth & Mael, 1989; Mathieu & Zajac, 1990; Randall, 1990) que funcionários que se identificam fortemente com a sua organização são mais propensos a mostrar uma atitude de apoio em direção a ela, contribuem positivamente para seu sucesso, e para tomada de decisões que são consistentes com os objetivos organizacionais (Simon, 1999). A Identificação Organizacional (IO) pode induzir os funcionários a se comportar de acordo com a identidade da empresa, com sua reputação e estratégia (Ashforth & Mael, 1996).

Além disso, os funcionários buscam um senso de propósito e significado, bem como um sentimento de identidade em seu trabalho, para muitos, o trabalho tornou-se um fim em si mesmo, o centro da vida de muitas pessoas ou quase uma nova religião (Myers & Diener, 1995). Atualmente, denota-se que as fronteiras entre trabalho e vida ofuscam-se cada vez mais, o papel desempenhado pelo trabalho na satisfação com a vida torna-se cada vez maior. Portanto, a satisfação com a vida representa uma avaliação cognitiva global da sua vida (Diener, 1985), e pode ser vista como uma atitude, uma avaliação resumida dos objetos ao longo de uma dimensão que varia de positivo para negativa (Petty, Wegener, & Fabrigar, 1997).

Assim, o presente estudo procurou avaliar a relação entre a identificação organizacional e a manipulação amoral de gestores organizacionais, a fim de testar essa relação com a satisfação com a vida. Para tanto, foram utilizados instrumentos para mensurar essas relações a partir da Escala de Satisfação com a Vida (SWL), a Escala de Identificação Organizacional (EIO) e a Escala de Personalidade Maquiavélica (MPS) utilizando-se das questões do construto de manipulação moral (MA), que abordam as dimensões necessárias para a investigação da problemática do estudo.

2 Referencial teórico

2.1 Amoralidade, poder e influência nas organizações

Mesmo que os objetivos organizacionais se diferenciem em seus contextos, indivíduos e grupos buscam constantemente atuar de forma conquistar a realização dos seus objetivos através de seus esforços organizacionais, alinhando-os com os interesses das organizações.

Nessa dinâmica do processo, o poder se apresenta como um aspecto de relevância no uso das habilidades de cada profissional e no seu relacionamento com os outros para a obtenção dos resultados almejados (Chalita, 2005). Apresenta-se como uma forma de utilizar de conhecimentos e domínio de informações que podem ou não gerar condições de manipulação, ora de dominação, ora a serem dominadas (Moura, 2011). A capacidade de decidir, dar ordens, fiscalizar seu cumprimento e acompanhar o processo, presentes na função de um gestor, também expressa uma das dimensões do poder presente no cotidiano organizacional, em que torna-se importante a conquista da manutenção deste poder (Maquiavel, 1513).

Na atualidade organizacional, o comportamento humano tem ganhado especial atenção. Dada sua complexidade e importância, aqueles indivíduos que demonstram uma falta de preocupação com a moralidade convencional são emocionalmente individualistas e tendem a manipular os outros, são identificados como pessoas com altos níveis de traços de personalidade maquiavélica (Christie & Geis, 2013). Porém, é importante observar como esse comportamento gera uma competição saudável, ou um desconforto organizacional, buscando o equilíbrio entre interesse organizacional e de seus empregados (Souza & Garcia, 2012).

O maquiavelismo é muitas vezes tratado como um estilo de liderança na literatura de psicologia organizacional, podendo encontrar resultados controversos sobre a relação do maquiavelismo e liderança. Líderes maquiavélicos, contudo, têm algumas habilidades importantes, eles são na maioria das vezes políticos, analíticos, estratégicos e carismático, podem promover com sucesso o seu interesse pessoal (Christie & Geis, 2013) e são especialmente eficazes em influenciar outros (Gardner & Avolio, 1998).

Algumas das características ligadas ao maquiavelismo no desempenho da liderança possuem uma influência desvantajosa, líderes High Machs normalmente não dão o devido suporte aos seus subordinados, não consideram os seus desejos ou emoções (Deluga, 2001), são geralmente direcionados ao objetivo (task), enquanto os indivíduos Low Machs tendem a ser líderes orientados para a pessoa (Christie & Geis, 2013). Portanto, algumas pessoas estão mais dispostas e são mais capazes do que outros de exibir um comportamento manipulador (Wilson et al., 1996), enquanto que outras são suscetíveis à influência social, e aceitam facilmente as regras e estruturas previamente definidas (Siegel, 1973).

Diante deste contexto, a manipulação amoral é descrita por Dahling, Whitaker e Levy (2009) como um construto que mede o quanto as pessoas maquiavélicas são capazes de manipular os outros, através do monitoramento e da administração de impressões, e demonstrando mais flexibilidade ao tomar decisões. Os autores acreditam que essas duas formas estão tão interligadas que as uniram em um mesmo construto: “moralidade abstrata é um pré-requisito para a propensão de se comprometer com comportamentos manipulativos” e completam definindo manipulação amoral como “propensão para romper padrões de moralidade e valorizar comportamentos que beneficiam o self à custa dos outros” (Dahling et al., 2009, pp. 227-228). Assim, torna-se interessante apontar a relação positiva entre a propensão à resolução de conflito e o maquiavelismo, por ser uma das razões por trás de seu desempenho específico na liderança, e pelas habilidades de manipulação que deriva da regulamentação superior do impulso (Jones & Paulhus, 2009).

Em suma, o maquiavelismo tem sido exaustivamente explorado e relacionado a alguns estudos organizacionais tais como liderança, desempenho profissional e competição, contudo, faz-se necessário que sejam feitas e testadas novas conexões, vinculadas a confiança, abuso e gestão do poder, pontos como a pro atividade, moralidade, carreira, competição e empreendedorismo.

2.2 Identificação organizacional

A teoria da identidade social (TIS) envolve o esclarecimento dos limites dentro e fora do grupo, que pode ajudar a definir “o lugar do indivíduo na sociedade”, uma vez que todo indivíduo esforça-se continuamente para encontrar uma unidade subjetiva, sendo ela formada das impressões pessoais (autoconceito), complementada pela impressão do grupo ao qual ele pertence, quem o indivíduo é em relação aos outros, considerando o grupo tal qual categoria social (Tajfel & Turner, 1979).

A forma como cada um se posiciona e se define tem que ver com a identidade pessoal e a identidade social. A primeira envolve características idiossincráticas, como traços de personalidade, interesses, atributos físicos; a segunda é resultante do conhecimento que o indivíduo tem a respeito da sua pertença a um ou mais grupos sociais, acrescido do valor e do significado emocional associado a essa pertença (Tajfel & Turner, 1979). Para os autores a identificação social define-se pelo componente cognitivo, que consiste no conhecimento que um indivíduo tem de que pertence a um grupo; pelo componente afetivo, que descreve o vínculo emocional a esse grupo; e pelo componente avaliativo que consiste no valor que o indivíduo atribui ao grupo a que pertence. Assim, construir a própria identidade é um desafio permanente no sentido de encontrar o equilíbrio entre aquilo que se é e o que os outros esperam que sejamos, sob a perspectiva que a existência do eu, se dá pela interação com os outros ou com o grupo (Whetten & Godfrey, 1998).

Pratt (1998) afirma que essa interação ocorre desde que percebida a saliência da identidade da organização, ou seja, desde que sejam ressaltados os atributos definidores da organização que passam a servir de referência para a definição do sujeito, compreendida pela identificação do indivíduo com a organização onde trabalha como o processo que acontece quando as crenças do próprio sobre a organização se tornam uma referência e definição para si (self-referential e self-defining). Assim, o autor define dois modos de identificação do indivíduo com a sua organização: identificação organizacional por afinidade (IOA) e identificação organizacional por imitação (IOI).

A identificação por afinidade acontece pelo reconhecimento, o indivíduo identifica-se com uma organização que ele acredita ter valores e crenças similares aos seus, é um processo onde “igual procura igual”. Nesse sentido, a identificação não envolve mudança da identidade, mas é um meio de compreender o relacionamento do indivíduo com a organização, pelo grau de relacionamento existente, sem que o indivíduo precise tornar-se um membro da organização para identificar-se com ela. Mael e Ashforth (1995) consideraram a possibilidade da identificação mesmo na ausência de interação do indivíduo com um grupo, expandido o conceito que o indivíduo é um membro organizacional e tem acesso a informações da organização, mesmo sem estar em contato frequente com ela.

A identificação por imitação remete ao ato de tornar-se idêntico, o indivíduo incorpora crenças e valores da organização, de forma gradual ou rapidamente, em sua identidade. Esse processo pressupõe uma formação da consciência do indivíduo, que em paralelo com a Teoria da Identidade Social, estabelece um processo no qual o indivíduo muda a visão do “eu” por meio das medidas do comportamento organizacional, nesse caso por meio da incorporação das crenças que ele possui a respeito do grupo social, da sua organização de trabalho. Este levantamento da literatura aponta como núcleo básico das definições da identidade organizacional a ideia de que a identificação ocorre quando as crenças do indivíduo acerca da sua organização tornam-se auto referências ou auto definidoras. Outro aspecto compartilhado pelos autores diz respeito à natureza cognitiva do construto (Mael & Tetrick, 1992; Dutton, Dukerich, & Harquail, 1994; Elsbach & Kramer, 1996; Abrams, Ando & Hinkle, 1998; Pratt, 1998).

Torna-se imperativo os estudos de tais variáveis psicológicas que permitam compreender as atitudes e comportamentos dos indivíduos em contexto organizacional. Dick, Wagner, Stellmacher, e Christ (2004) destacam os componentes afetivos, cognitivos e valorativos da identificação e realçam o fato dos resultados de algumas investigações conduzirem a uma dimensão comportamental. Assim, à semelhança do ocorrido em definições anteriormente citadas, o componente cognitivo relaciona-se com o conhecimento que o indivíduo possui de integrar um determinado grupo; o afetivo com o vínculo emocional com ele estabelecido; e o avaliativo ou valorativo com o valor atribuído ao grupo em questão. No referente à dimensão comportamental, esta relaciona-se com a participação do indivíduo em ações relevantes para o grupo a que pertence.

Assim sendo, quanto mais uma pessoa se identificar com um grupo, mais aplica os atributos e características do mesmo ao seu self, e mais os resultados para o grupo são experienciados como sendo resultados para o próprio (Turner, Hogg, Oakes, Reicher, & Wetherell, 1987). Por outras palavras, quando os indivíduos se identificam com um grupo, vinculam-se psicologicamente a ele e às suas práticas, passando a partilhar as suas vivências positivas e negativas, as suas experiências, os seus sucessos e fracassos e o seu destino (Marra, Fonseca & Marques, 2014). Partindo desta perspectiva, Ashforth e Mael (1989) e Mael e Ashforth (1992), foram os primeiros teóricos a aplicarem as contribuições de Tajfel e Turner à teoria organizacional, argumentando que a identificação organizacional pode ser entendida como um subtipo de identificação social em que o indivíduo se define a si próprio em termos da sua associação e pertença à organização onde trabalha (Ashforth & Mael, 1989; Mael & Ashforth, 1992; Dutton et al., 1994).

2.3 Satisfação com a vida

O trabalho constitui mais de um terço da vida de vigília para a maioria dos adultos humanos, e há uma literatura psicológica substancial dedicada ao estudo do trabalho. Satisfação com o trabalho varia amplamente entre os indivíduos (Staw & Ross, 1985) e parece constituir uma parte substancial do assunto qualidade de vida (Loscocco & Rochelle, 1991).

Em uma medida de satisfação global com a vida, a satisfação no trabalho explicou 20% da variação de toda a medida (Campbell, Converse, & Rodgers, 1976). Isso sugere que a forma como os indivíduos veem o trabalho pode ter uma função de equilíbrio nestes traços, sendo não apenas reflexos do trabalho em si. É possível que estes traços possam interagir com as características objetivas do trabalho (Hackman & Oldham, 1980; Hulin & Blood, 1968; Schneider, 1983). Por estas razões, acredita-se que é importante compreender a experiência subjetiva de como os indivíduos diferem em sua experiência do trabalho que fazem.

As condições de trabalho, por sua vez, refletem diretamente no bem-estar do indivíduo tanto na saúde mental quanto física, podendo provocar inclusive doenças vinculadas ao estresse e outras patologias físicas e psicológicas. Segundo Mendes e Ferreira (2008) as condições de trabalho envolvem as condições do ambiente físico, a organização do processo de trabalho e as relações que se estabelecem entre os atores envolvidos.

Para Ryan e Deci (2000), a taxonomia da motivação humana está baseada em três aspectos considerados como necessidades humanas inatas: autonomia, relacionamento pertencimento e competência que quando satisfeitas, permitem o aumento do bem-estar. Esse pertencimento tem relação direta com a identificação organizacional também utilizada nesse estudo. Nessa relação, denota-se que pessoas que têm carreiras de sucesso têm um investimento pessoal mais profundo em seu trabalho e consideram as suas realizações, não só através de ganho monetário, mas por meio do avanço dentro da estrutura ocupacional. Esse avanço muitas vezes traz uma alta posição social, status na sua atividade profissional, e maior autoestima para o trabalhador (Bellah, Madsen, Sullivan, Swidler, & Tipton 2007).

Neste contexto, o bem-estar subjetivo é um construto que também sofre influência cultural (Lykken & Tellegen, 1996). Concebendo cultura como experiências compartilhadas que formam a base de uma maneira similar de se ver o mundo, não há como descartar o seu papel na experiência no bem-estar social das pessoas. O sentido das experiências dos indivíduos é construído socialmente através de crenças, pressuposições e expectativas sobre o mundo (Heller apud Smith & Bond, 1999).

2.4 Hipóteses e modelo do estudo

A dimensão moral implica em um posicionamento de cada pessoa frente aos valores, princípios e deveres que dão significado às relações com os demais seres humanos. Dentro do contexto social, os indivíduos desenvolvem suas potencialidades nos grupos aos quais fazem parte, elaborando critérios que orientam e justificam suas ações como corretas ou não, definindo assim sua moralidade.

A reflexão crítica sobre a moralidade inclui um caráter normativo, pois relaciona a coerência dos valores que norteiam as ações nos processos de relacionamentos, podendo definir uma identidade. Essa identidade gera uma identificação pessoal e social que se estende aos grupos dos quais os indivíduos se associam, criando uma identificação própria nestes grupos, como é o caso do grupo profissional, dando origem a identificação organizacional.

Ao identificar-se com a organização, o envolvimento do indivíduo torna-se intenso com a sua atividade desenvolvida, criando um sentimento ou a sensação de que através dessa atividade consegue expressar sua autorealização e o desenvolvimento de suas competências no alcance dos seus objetivos de vida (Waterman, 1990, 1992), tornando-o satisfeito com a vida pelo seu julgamento acerca da satisfação com sua vida profissional.

Porém, muitas vezes o alcance destes objetivos, ultrapassa os limites morais gerando discrepâncias entre as realizações na vida do indivíduo e o seu nível de referência de satisfação com a vida. Por isso, a percepção do indivíduo em relação aos seus comportamentos pode influenciar a satisfação com a vida, dando origem a reações diferentes dependendo de cada indivíduo.

A partir dos estudos apresentados na abordagem teórica, busca-se aprofundar o conhecimento destes construtos, a partir da avaliação da relação entre a identificação organizacional e a manipulação amoral de gestores organizacionais, a fim de testar essa relação com a satisfação com a vida. Assim, elaboraram-se as seguintes hipóteses de investigação:

H1: A manipulação amoral se relaciona de forma negativa com a satisfação com a vida.

H2: A identificação organizacional se relaciona de forma positiva com a satisfação com a vida.

H3: A relação entre a amoralidade e a satisfação com a vida é moderada pela identificação organizacional.

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Figura 1. O efeito moderador da identificação organizacional

Fonte: Elaborado pelos autores (2016).

3 Procedimentos metodológicos

O presente estudo foi realizado por meio de uma survey de natureza transversal, descritiva e quantitativa (Hair Jr, Babin, Money, & Samouel, 2005), tendo como participantes 188 indivíduos que atuam como gestores de empresas elegidos de forma não probabilística, por conveniência. Os respondentes podem ser caracterizados em sua maioria por mulheres (52,8%), homens (47,2%), destes 55,8% apresentam formação superior já concluída ou em andamento, e 41.6% possui pós-graduação. Quanto ao tempo de empresa da amostra, 42,64% tem entre 1 e 5 anos de vínculo com a mesma organização.

A coleta dos dados ocorreu através de questionário composto de questões fechadas, aplicados de forma presencial a gestores de organizações do setor de prestação de serviços. O critério de seleção dos participantes foi a exigência dos participantes estarem em funções de direção ou liderança de equipes e projetos. O instrumento de coleta utilizou uma escala tipo Likert de sete pontos para a mensuração das respostas. Adaptou-se se a pontuação das escalas originais pela escala Likert de 7 pontos, em que todas as escalas foram medidas indicando as respostas o intervalo de “Discordo Totalmente” (1) à “Concordo Totalmente” (7). O questionário da pesquisa teve como base a Escala de Satisfação com a Vida - SWL (Satisfaction with Life Scale), elaborada na sua versão original por Diener et al. (1985) e revisada por Pavot e Diener (1993), a Escala de Identificação Organizacional validada por Oliveira (2008) e a Escala de Personalidade Maquiavélica (MPS) de Dahling et al. (2009) validada por Grohmann e Battistella (2012) utilizando-se das questões do construto original da escala que abordam a manipulação moral (MA).

A Escala de Identificação Organizacional (EIO) é uma medida multidimensional, construída e validada que tem o objetivo de verificar o modo de identificação do empregado com sua organização de trabalho. Sua validação deu-se a partir da descrição dos modos de identificação organizacional por afinidade e imitação sugeridas por Pratt (1998) pela distinção conceitual de três aspectos: grau (forte versus mais forte), permanência (menos versus mais permanente) e motivação. Em sua versão original os itens da escala formaram dois fatores, o fator 1, Identificação Organizacional por Afinidade (IOA) composto por nove itens, e o fator 2 Identificação Organizacional por Imitação (IOI) composto por oito itens, sendo que a soma das pontuações nos dois fatores produziu um escore de Identificação Organizacional total. A consistência interna desses fatores apresentaram valores de 0,72 e 0,82 para o primeiro e segundo fator, respectivamente, e no geral 0,79, sugerindo que avaliam seus construtos de forma homogênea.

A Escala de Personalidade Maquiavélica proposta por Dahling, Whitaker e Levy (2009) visa identificar o maquiavelismo organizacional, composta por 45 itens divididos em quatro construtos: descrença nos outros, manipulação amoral, desejo de status e desejo de controle. Na sua validação por Grohmann e Batistella (2012), apresentou uma consistência interna de 0,760, com nível de significância de 0,000 considerados bons índices (Pestana & Gageiro, 2000), reduzida para 19 variáveis com cargas fatoriais acima de 0,60. Porém para esse estudo, aplicou-se apenas o construto da manipulação amoral (MA) em sua versão original com 14 variáveis.

A Escala de Satisfação com a vida tem como objetivo avaliar a percepção subjetiva que os indivíduos fazem sobre a qualidade de suas próprias vidas num sentido global e não apenas por domínios específicos. Na validação da SWL, estudos demostram uma forte consistência com um coeficiente de alfa 0,87 e uma variância explicada de 66% (Pavot & Diener, 1993), confirmados por Arrindell, Meeuwesen e Huyse (1991) e Pavot e Diener (1993). Também revelou adaptação para diferentes culturas mantendo seus níveis de fidelidade e validade (Simões, 1992; Neto, 1999; Schimmack, Radhakrishnan, Oishi, Dzokoto, & Ahadi, 2002; Espinosa, Freire, & Ferrándiz, 2016).

Dessa forma, o instrumento de coleta de dados foi composto de 17 itens que medem a identificação organizacional divididos em 2 grupos, 09 itens abordam a identificação organizacional por afinidade e 08 que abordam a identificação organizacional por imitação, 14 itens que medem a manipulação amoral e 05 itens que medem a satisfação com a vida. Por fim, foram elaboradas questões informativas relacionadas as características pessoais e profissionais para caracterização da amostra.

Para a análise dos dados, os mesmos foram primeira tabulados em planilha eletrônica Microsoft Excel® e após tratados com o software SPSS –Statistical Package for the Social Sciences (versão 20) para Windows®. Pela análise estatística descritiva das variáveis foi possível a caracterização dos respondentes da pesquisa, a verificação dos dados ausentes (missings) e extremos (outliers) e a identificação do nível de identificação organizacional, manipulação amoral e satisfação com a vida (médias e desvios padrões). Na sequência, realizou-se a verificação da confiabilidade das escalas utilizadas, através dos coeficientes de Alpha de Cronbach (> 0,7) (Hair Jr. et al., 2005), assim como os testes KMO - Kaiser-Meyer-Olkin e de Esfericidade de Bartlett (> 0,5) (Pestana & Gageiro, 2005).

Após essa verificação, para a análise dos dados utilizou-se a técnica de análise multivariada dos dados, por meio da realização da análise fatorial confirmatória e da regressão linear múltipla, sendo possível a confirmação dos construtos por meio das escalas utilizadas e explorar a relação entre as variáveis do estudo e (Hair Jr. et al., 2005; Pestana & Gageiro, 2005). Pela técnica de Análise Fatorial Confirmatória foi possível a verificação das cargas fatoriais com valores superiores a 0,5 (Hair Jr. et al., 2005) e a confirmação do agrupamento das variáveis conforme proposto pelos construtos teóricos: identificação organizacional, manipulação amoral e satisfação com a vida. Na observação do agrupamento das variáveis, considerou-se os índices de comunalidade como critério de seleção para exclusão de variáveis com valores inferiores à 0,5, o que sugeriu um novo modelo para a escala do fator manipulação amoral.

Com a média calculada das variáveis que compõem os fatores, foi possível analisar as variáveis dependentes e independentes pela técnica de regressão linear múltipla (Pestana & Gageiro, 2005) por meio dos construtos abordados pelas escalas apresentadas, assim como testar o efeito moderador da identificação organizacional na relação entre a manipulação amoral e a satisfação com a vida. Para realizar esta análise, foi utilizado o MODPROBE, macro para o SPSS que permite analisar a moderação em modelos de regressão linear (Hayes, 2009), observando o índice de significância estatística de 5% (p < 0,05) permitindo uma confiança de 95% em relação às conclusões do estudo, como também demonstrar o percentual, medido pelo coeficiente de determinação (R²).

4 Apresentação e análise dos resultados

Mediante a análise das médias das variáveis relacionadas a cada construto da pesquisa (Tabela 1), constata-se que os valores das médias dos construtos são significativamente superiores ao ponto médio das escalas de respostas (3,5) e ao valor de t 17.534, apresentando um grau de concordância em relação às afirmativas do modelo teórico acima do valor cinco (5 pontos). Porém, cabe ressaltar que a média do construto Manipulação Amoral apresenta média de 1,8395 pelo seu sentido inverso, ou seja, ao apresentar menor valor, indicam um maior nível de comportamento amoral.

Tabela 1. Médias, desvios-padrão, valores Teste t e escala de respostas (n=188)

Construtos

Médias

Desvio Padrão

Teste t

Escala de Respostas

IOA

5,5928

0,7533

101,795*

1 à 7

IOI

5,5904

0,9237

82,983*

MA

1,8395

1,1490

21,950*

SWL

4,9617

1,1170

60,905*

* Nível de significância p<0,001

Fonte: Dados da pesquisa (2016).

A partir das médias das respostas e pela baixa variabilidade destas (desvio padrão entre 0,7533 e 1,1490) é possível constatar que os participantes da pesquisa apresentam níveis elevados de identificação organizacional, de manipulação e satisfação com a vida, concluindo assim que encontram-se satisfeitos com a vida, identificam-se com as suas organizações de trabalho e concordam que existe comportamento amoral em suas relacionamentos, porém de forma controlada em níveis abaixo da média superior (3,5), o que demonstra que as questões éticas são percebidas como presentes mas respeitadas dentro dos contextos organizacionais (Grohmann & Bastistella, 2012).

Para análise da validade e confiabilidade das medidas das variáveis do estudo, foi aplicada a análise fatorial confirmatória (AFC). Para medir a confiabilidade realizou-se o cálculo de Alfa Cronbach para cada construto, mostrando-se adequados seus valores, acima de 0,7 (Hair, Black, Babin, Anderson, & Tatham 2008). Após verificou-se o teste de esfericidade de Bartlett, o qual apresentou-se significativo para cada construto do estudo, e a medida de adequação de KMO, que resultou em valores superiores a 0,5 (Pestana & Gageiro, 2005). Os dados seguem apresentados na Tabela 2.

Tabela 2. Testes de validade e confiabilidade dos construtos da pesquisa

Construtos

Alpha de Cronbach

KMO

Esfericidade de Bartlett

Qui quadrado

Sig.

IOA

0,824

0,804

590,662

0,000*

IOI

0,883

0,861

751,495

0,000*

MA

0,890

0,885

644,070

0,000*

SWL

0,873

0,852

463,337

0,000*

* Nível de significância p<0,001

Fonte: Dados da pesquisa (2016).

Após os testes acima mencionados, pela técnica da análise fatorial confirmatória dos dados, identificou-se a confirmação dos construtos através do método de Análise dos Componentes Principais que agrupa as variáveis conforme as relações que ocorrem entre si e podem compor um novo conjunto de fatores (Hair Jr., Anderson, Tatham, & Black, 1998). Esse agrupamento permitiu a confirmação dos construtos conforme a teoria abordada, assim como a explicação da variância dos dados deste estudo. Para os construtos identificação organizacional e satisfação com a vida, observou-se que os valores da comunalidade, das cargas fatoriais e o percentual de explicação apresentaram-se de acordo, sendo os valores aceitáveis entre 0 e 1, quanto mais próximos de 1 mais indicam que todas as variâncias são explicadas pelos fatores comuns (Hair Jr. et. al., 1998), critério que contribuiu também para o agrupamento das variáveis. Porém, para o construto da manipulação amoral, algumas das variáveis apresentaram valores discrepantes ao aceitável. Assim diante desses resultados, optou-se por analisar as variáveis a partir do agrupamento de um único fator como o modelo inicial proposto, mas com a exclusão de algumas perguntas o que possibilitou um maior grau de explicação do construto, melhores índices de confiabilidade (Alpha de Cronbach 0,890) e maior adequação do modelo (KMO 0,885), corroborando com o estudo de validação da escala realizado por Grohmann e Bastistella (2012).

Para melhor visualização dos resultados da análise apresentam-se as cargas fatoriais das variáveis e o percentual de explicação de cada fator confirmando o modelo inicial com a adequação do construto da manipulação amoral (Tabela 3).

Tabela 3. Análise fatorial confirmatória dos componentes principais por construto

Construtos

Variáveis

Carga Fatorial

% de Variação do Fator

IOA

IO1

0,693

44,886%

IO3

0,588

IO4

0,477

IO5

0,732

IO8

0,760

IO10

0,607

IO11

0,713

IO14

0,553

IO17

0,647

IOI

Variáveis

Carga Fatorial

IO2

0,636

55,194%

IO6

0,685

IO7

0,762

IO9

0,814

IO12

0,780

IO13

0,791

IO15

0,785

IO16

0,670

MA

Variáveis

Carga Fatorial

MA22

0,710

65,920%

MA23

0,769

MA26

0,752

MA27

0,869

MA30

0,884

MA31

0,871

SWL

Variáveis

Carga Fatorial

SV32

0,832

67,339%

SV33

0,788

SV34

0,864

SV35

0,834

SV36

0,778

Fonte: Dados da pesquisa (2016).

Para verificação das hipóteses do estudo, procedeu-se com análise de regressão sendo possível testar a influência das variáveis preditoras (amoralidade e identificação organizacional) na satisfação com a vida (variável dependente) considerando as médias do somatório dos itens que compõem cada construto. Os resultados da análise (Tabela 4) mostram que a variável manipulação amoral tem um efeito estatisticamente significativo e de influência negativa sobre a satisfação com a vida (β= -1,5705; p<0,05), o que confirma a H1 do estudo.

Para testar a influência da identificação organizacional, considerou-se as duas dimensões do construto: identificação por afinidade (IOA) e identificação por imitação (IOI). A hipótese 2 previa uma relação direta e positiva entre a identificação organizacional e a satisfação com a vida, porém a mesma não foi suportada neste estudo (β= -0,1144; p=0,5692), ou seja, essa variável não apresenta poder de explicação sobre a satisfação com a vida, como também apresentou um efeito negativo, refutando assim, a H2.

Tabela 4. Resultados da Regressão entre identificação organizacional
e manipulação amoral na satisfação com a vida (n=188)

Satisfação com a Vida

Β

T

Sig.

Constante

5,8301

5,0964

0,0000*

MA

-1,5705

-2,3366

0,0205**

IOI

-0,1144

-0,5702

0,5692

MA x IOI

0,2591

2,1854

0,0300**

0,0916*

F

6,1857

* Nível de significância p<0,001

** Nível de significância p<0,05

Fonte: Dados da pesquisa (2016).

Para testar o efeito moderador da identificação organizacional, sobre a relação entre a manipulação amoral e a satisfação com a vida, foi testado o modelo a partir da inclusão da variável de interação entre a identificação organizacional e a manipulação amoral. Pelos resultados apresentados (Tabela 4), encontra-se sustentação para a hipótese 3 deste estudo, em que o efeito moderador é verificado de maneira significativa (β=0,2591; p<0,001), e em uma relação positiva. Além disso, pode-se afirmar que o coeficiente de determinação do modelo foi significativo (R²=0,0916; F=6,1857; p<0,001), explicando 9,16% da variação observada, sugerindo uma forte adequação do modelo de regressão para a explicação do comportamento da variável dependente.

Dessa forma, conclui-se que os resultados encontrados suportam a H3, uma vez que o efeito moderador da identificação organizacional age sobre a relação entre a variável independente (manipulação amoral) e a variável dependente (satisfação com a vida), indicando que o coeficiente de inclinação, varia conforme diferentes valores do moderador.

Torna-se importante salientar que a identificação organizacional como variável moderadora neste estudo, se deu pela dimensão da imitação, demonstrando-se significativa na interação com a manipulação amoral, o que não apresentou a dimensão por afinidade. Esse resultado encontra relação com os estudos de Pratt (1998) em que o indivíduo identifica-se com a organização pro meio do meio do ato de torna-se idêntico e incorporar as crenças e valores organizacionais, o que facilita a um comportamento de manipulação amoral.

Para uma melhor compreensão desta análise, o Gráfico 1 demonstra o efeito moderador da identificação organizacional por imitação na relação entre as variáveis. Os resultados indicam que a cada ponto em que se eleva a identificação organizacional, nota-se que o efeito moderador passa a não mais existir, confirmando assim que quanto maior a identificação do indivíduo com a sua organização, menor será sua percepção de comportamento amoral e maior será sua satisfação com a vida.

Gráfico 1. Moderação entre manipulação amoral, satisfação com
a vida e identidade organizacional por imitação

2644.png

Fonte: Dados da Pesquisa (2016).

O processo de pesquisa das variáveis que interferem no comportamento organizacional torna-se cada vez mais relevantes para as organizações. Neste estudo buscou-se explorar a relação entre a manipulação amoral e a satisfação com a vida frente a condição de reconhecimento da identificação organizacional pelos indivíduos pesquisados.

Os resultados comprovaram que a relação negativa entre a variável manipulação amoral na satisfação com a vida, demonstrando que quanto mais comportamentos de manipulação e influência sobre os demais, menos satisfeitos com a vida os pesquisados se sentem. Nesse contexto, as características do indivíduo maquiavélico tais como manipulação ou inclinação ao self em detrimento do grupo teria sido deixado de lado dando maior relevância aos interesses do grupo, podendo ser considerada como uma estratégia de adaptabilidade para um ganho futuro.

As mudanças no ambiente organizacional têm causado alterações na relação empregador-empregado, tornando-se menos paternalista e mais instrumental (Kanter & Mirvis, 1989; Kissler, 1994). Como resultado, os funcionários muitas vezes percebem que suas organizações obstruem seus objetivos pessoais e profissionais, e acreditam que eles devem olhar para si mesmos e suas carreiras, mais do que nunca (Anderson & Schalk, 1998). Em outras palavras, os empregados são mais propensos a acreditar que os “fins justificam os meios” de hoje, e, como resultado, a tendência de empregados High Mach são susceptíveis de ser evidente com maior regularidade, porém essa relação acaba, por vezes, gerando uma insatisfação ao indivíduo quanto à esfera profissional da sua vida, os funcionários acabam por perceber que os seus contratos psicológicos foram violados (Zottoli, 2003).

Quando há a ruptura (breach) deste contrato psicológico acontece a “desidentificação”, que segundo Woodard et al. (2009) encontra resultados consistentes na relação entre indivíduos High Machs e Identificação Organizacional. O estudo mostra que High Machs identificam-se da mesma forma que Low Machs, porém “desidentificam-se” muito mais rapidamente quando há ruptura do contrato psicológico. É neste contexto, que podemos entender o comportamento da variável identificação organizacional na relação com a satisfação com a vida, apresentando-se de forma negativa, e apenas por uma das dimensões da identificação organizacional. A dimensão aceita pela H2 do estudo pode ser justificada pela questão de que ao ocorrer a identificação por imitação, o indivíduo pode não estar totalmente vinculado à organização que trabalha, pela ideia de que a identificação ocorre quando as crenças do indivíduo acerca da sua organização tornam-se auto referências ou auto definidoras (Pratt, 1998).

No entanto, ao testar a H3 do estudo, a relação entre a manipulação amoral com a satisfação com a vida torna-se mais complexa, e é explicada de forma positiva e significativa ocorrendo o efeito moderador pela variável identificação organizacional. Em resumo, pode-se dizer que quando os indivíduos têm uma relação baixa de identificação organizacional, entendem que a manipulação amoral torna-os menos satisfeitos com a vida, porém à medida que esta relação aumenta, havendo uma maior identificação organizacional, mesmo que seja apenas pela dimensão que o torna idêntico sem haver uma relação de afinidade que o aproxima por um reconhecimento de suas crenças e valores, a forma como manipula e influência os demais passa a não expressar uma significância na satisfação com a vida.

A satisfação com a vida em geral vem de sensações advindas dos valores, necessidades e aspirações de várias esferas da vida, reflete sensação de prazer e satisfação bem como os componentes da atitude positiva para com a realidade em que vivem. Reflete o equilíbrio entre a situação atual e a pessoa que deseja ser. Em outras palavras, a diferença entre o nível de desejo do indivíduo e da sua qualidade objetiva desejada, é maior do que a sua satisfação, diminuindo as demais relações que remetem a esta satisfação.

5 Considerações finais

O presente estudo teve como finalidade averiguar qual a relação existente entre manipulação amoral e satisfação com a vida, verificando se a identificação organizacional poderia influenciar esta relação e causar diferentes reflexos na satisfação com a vida. Nesta investigação foi possível abordar as percepções dos indivíduos pesquisados, em relação aos comportamentos de influência e manipulação como forma de alcançar os objetivos pessoais e beneficiar-se a si mesmo. Também foi possível explorar como esses comportamentos são identificados e vinculados em suas atividades profissionais, considerando que, ao identificar-se com a empresa para a qual trabalha as pessoas comprometem-se em busca do alcance dos objetivos organizacionais, e acabam alinhando os seus objetivos pessoais a estes também, que ao serem atingidos em sua plenitude, passam a gerar a satisfação com uma das dimensões centrais da vida das pessoas, o trabalho, levando a uma maior satisfação com suas vidas.

Os resultados demonstram que a manipulação amoral tem reflexos negativos na percepção dos indivíduos, quanto a satisfação com a vida, verificando que comportamentos não éticos que prevalecem as formas de trapacear os demais, não são vistos como satisfatórios para o alcance de uma vida boa ou desejada. Porém, nota-se que ao ser moderada esta relação com a identificação organizacional, a medida em que ocorre o aumento desta identificação, aumenta a satisfação com a vida, considerando que esta satisfação deriva de uma relação de variáveis do que geram o bem-estar subjetivo e social dos indivíduos.

A maneira como o indivíduo forma sua percepção decorre das suas relações com as demais pessoas e grupos, por isso quando suas crenças se tornam referências ou identificação, o indivíduo incorpora ou assimila as crenças da organização com as suas, propiciando o alinhamento dos objetivos pessoais com os organizacionais, levando ao desempenho de suas atividades a uma maior satisfação. Por outro lado, essa constatação leva ao questionamento sobre a aceitação as práticas organizacionais em relação ao comportamento amoral na medida em que incorporam essas atitudes como “regras do jogo” ou mesmo como valores organizacionais. Em outros termos, com base nos resultados encontrados é possível questionar se as organizações validam a amoralidade, sugerindo que essa aceitação contribua para maior satisfação com a vida. Nessa direção, sugere-se a realização de estudos futuros que analisem essa relação de forma mais aprofundada.

Assim, conclui-se que a identificação organizacional é uma variável importante no exercício das atividades dos indivíduos, a forma como este reconhece ou identifica-se com a empresa, pode gerar diferentes comportamentos que levam ao atingimento dos objetivos organizacionais com sucesso ou não, dependendo da percepção do quanto essa variável poderá gerar de satisfação na vida destes indivíduos.

Embora os conceitos identificação organizacional, satisfação com a vida e manipulação ou influência amoral, já tenham sido discutidos pela teoria, este estudo adicionou a relevância da moderação na relação destas três variáveis, mostrando que uma condição pode influenciar ou contribuir para a mudança de uma relação já existente, o que torna-se relevante para que próximos estudos possam usar novas variáveis moderando relações e contribuindo para a continuidade do entendimento dos estudos em comportamentos organizacionais.

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Revista de Administração IMED, Passo Fundo, vol. 8, n. 1, p. 3-25, Jan.-Jun., 2018 - ISSN 2237-7956

[Recebido: Ago. 09, 2016; Aprovado: Fev. 22, 2018]

DOI: https://doi.org/10.18256/2237-7956.2018.v8i1.1478

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