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Conhecimento de cirurgiões dentistas sobre antimicrobianos e resistência bacteriana

Knowledge of dental surgeries on antimicrobials and bacterial resistance

Ully Cristy Porto Alegre(1), Graziela Oro Cericato(2), Débora Alves Nunes Mario(3), Vinícius Fabris(4)

1. Aluna do curso de graduação em Odontologia da Faculdade Meridional (IMED), Passo Fundo/RS, Brasil.
E-mail: [email protected] | ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1366-1521

2. Docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Odontologia da Faculdade Meridional (IMED), Passo Fundo/RS, Brasil.
E-mail: [email protected] | ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5598-7565

3. Docente do Curso de Medicina da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), Uruguaiana/RS, Brasil.
E-mail: [email protected] | ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7021-3245

4. Docente do Curso de Odontologia da Faculdade Meridional (IMED), Passo Fundo/RS, Brasil.
E-mail: [email protected] | ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1037-4420

Resumo

Antimicrobianos são frequentemente prescritos por cirurgiões dentistas por razões terapêuticas e profiláticas para tratar infecções orofaciais. O uso inadequado e indiscriminado desses fármacos pode acarretar a seleção de microrganismos resistentes, gerando um problema de saúde pública. Pelo fato destes fármacos serem utilizados em todas as áreas da Odontologia, é indispensável que os cirurgiões dentistas tenham adequado conhecimentos a respeito dos antimicrobianos. Objetivo: verificar o nível de conhecimentos de cirurgiões dentistas sobre prescrição de antimicrobianos. Metodologia: foi aplicado questionário estruturado a 242 cirurgiões dentistas que atuam na cidade de Passo Fundo, Rio Grande do Sul, com questões demográficas e específicas sobre prescrição de antibacterianos. Os dados obtidos foram tabulados em uma planilha eletrônica do programa Excel e exportados para o programa estatístico StataSE 12 para a análise estatística. Resultados: dentre os entrevistados, aproximadamente 29% dos cirurgiões dentistas, utilizaram como critério de escolha de um antimicrobiano ser bactericida, e como método de se evitar a resistência bacteriana a maioria optou por receitar antimicrobiano apenas quando necessário. O medicamento de primeira escolha de, aproximadamente, 54% dos entrevistados foi a Amoxicilina e, para pacientes alérgicos a penicilina, a maioria utilizaria a Clindamicina. Conclusão: a partir da análise das respostas, pode-se concluir que cirurgiões dentistas possuem pouco conhecimento sobre antimicrobianos, bem como ações a serem realizadas para evitar a resistência bacteriana, sendo necessário uma melhora nos critérios do uso e prescrição de antimicrobianos e o estabelecimento de estratégias de educação continuada sobre este assunto com o objetivo de diminuir a incidência de problemas relacionados a prescrição desses medicamentos.

Palavras-chave: Resistência a Antibióticos; Antibacterianos; Antibioticoprofilaxia; Cirurgião dentista; Prescrições medicamentosas.

Abstract

Antimicrobials are often prescribed by dental surgeons for therapeutic and prophylactic reasons to treat orofacial infections. The inappropriate and indiscriminate use of these drugs can lead to the selection of resistant microorganisms, generating a public health problem. Because these drugs are used in all areas of dentistry, it is essential that dental surgeons have adequate knowledge of antimicrobials. Objective: this study aimed to verify the level of knowledge of dental surgeons on prescription of antimicrobials. Methodology: a structured questionnaire was applied to 242 dental surgeons who work in the city of Passo Fundo, Rio Grande do Sul, with demographic and specific questions about antibacterial prescription. The data obtained were tabulated in an Excel spreadsheet and exported to the statistical program StataSE 12 for statistical analysis. Results: among those interviewed, approximately 29% of dental surgeons used as a criterion for choosing an antimicrobial to be bactericidal, and as a method of avoiding bacterial resistance the majority chose to prescribe antimicrobial only when necessary. The primary drug of approximately 54% of respondents was Amoxicillin and, for patients allergic to penicillin, most would use Clindamycin. Conclusions: from the analysis of the responses, it can be concluded that dental surgeons have little knowledge about antimicrobials and what should be done to avoid bacterial resistance, being necessary an improvement in the criteria of the use and prescription of antimicrobials and a continuing education on this subject for professional to decrease the incidence of problems related to the prescription of these drugs.

Keywords: Drug Resistance; Microbial; Anti-Bacterial Agents; Antibiotic Prophylaxis; Dentists; Prescription medication.

Introdução

Infecções microbianas podem ser tratadas ou evitadas através do uso de antimicrobianos, com finalidade profilática ou terapêutica. Entretanto, o uso inadequado desses medicamentos, seja pelo tratamento de doenças não infecciosas ou pela prescrição de medicamentos incorretos, acarreta a seleção de microrganismos resistentes a uma ou mais classes de antimicrobianos, permitindo a progressão da doença com possível óbito do paciente acometido (1,2).

Cada vez mais casos de microrganismos resistentes ou multirresistentes são relatados na literatura, e muito se tem investido na pesquisa de novos fármacos antimicrobianos. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), por meio da Coordenação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados, publicou a RDC n° 44/2010 (3), a qual regulamenta o controle da venda de antibacterianos. A partir da publicação dessa regulamentação, esses medicamentos passaram a ser dispensados em farmácias e drogarias somente perante apresentação de receita.

Qualquer clínico que prescreve antibióticos deve ter conhecimento dos parâmetros importantes que dizem respeito ao seu uso (4). Na odontologia os antimicrobianos são utilizados em diferentes áreas, com a finalidade de tratar ou prevenir infecções orofaciais. É importante, por estas razões, que os cirurgiões dentistas estejam preparados para exercer o uso correto desses fármacos, sendo capazes de identificar a necessidade, momento e forma de usá-los corretamente (5).

Relatos de uso incorreto de antibióticos por cirurgiões dentistas são crescentes, ainda que o número de prescrições escritas por cirurgiões dentistas seja pequeno comparado às prescrições concedidas por médicos, com índice de 7 a 11% de prescrições de antibacterianos (6). Quando não há risco de infecção e o paciente é imunocompetente, a profilaxia antibiótica não é indicada. Quando existe uma infecção bacteriana estabelecida, estes profissionais devem ter em mente que é necessário, primeiramente, a remoção da causa. O uso exclusivo do antibiótico, não é eficiente se aplicado de forma isolada, sendo necessário intervir na fonte de infecção. Por isso o antibiótico deve ser considerado um auxiliar na terapêutica de infecções (4).

Microrganismos com diferentes mecanismos de resistência aos antimicrobianos são um problema global e crescente, uma vez que a descoberta de novos medicamentos não está acompanhando o acelerado surgimento de novos casos de resistência (4). Diante desses fatos, a avaliação do conhecimento de cirurgiões dentistas sobre a prescrição de medicamentos se faz necessária para se estimar a necessidade da projeção de campanhas e cursos de atualização que possam contribuir para evitar o surgimento de novos casos de resistência microbiana.

Desta forma, o objetivo deste trabalho é verificar o nível de conhecimentos de cirurgiões dentistas sobre prescrição de antimicrobianos e sobre as consequências de uma prescrição incorreta relacionado à resistência bacteriana.

Metodologia

Delineamento do estudo e amostra

Este estudo caracteriza-se como observacional, transversal, denominado inquérito. O estudo foi realizado com uma amostra probabilística de 242 cirurgiões dentistas que atuam na cidade de Passo Fundo, Rio Grande do Sul, Brasil. Estes foram sorteados de maneira aleatória sem distinção de idade, sexo ou especialidade.

O cálculo da amostra foi realizado com base no total de cirurgiões dentistas que atuam em Passo Fundo, 640 cirurgiões dentistas, segundo o site do Conselho Regional de Odontologia (CRO), obtendo-se o valor final de 225. Sabendo-se que pode haver perdas no decorrer da pesquisa, foi somado 10% na amostra obtida, finalizando uma amostra de 250.

Coleta de dados e procedimentos

A coleta dos dados foi realizada através da aplicação de um questionário formulado por Trento et al. (2014), com questões que serviram como instrumento para avaliar o grau de conhecimento de cirurgiões dentistas sobre antimicrobianos e resistência microbiana. Além dos dados demográficos e profissionais (sexo, ano de graduação, especialidade, vinculação ao serviço público ou privado), o questionário compreende 6 questões objetivas de avaliação dos conhecimentos relativos à indicação de uso de antibacterianos e profilaxia antibiótica.

O pesquisador explicou a análise para o cirurgião dentista e, com a concordância deste, foi aplicado o questionário para o profissional. Para aplicar o questionário com profissionais que trabalham em clínicas odontológicas, houve um termo de autorização de local assinado pelo responsável pela clínica ou instituição.

Os questionários entregues para os cirurgiões dentistas são confidenciais, sem qualquer identificação e mantidos separadamente do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) que, após assinado pelo pesquisador e pelo pesquisado, foi armazenado em um segundo envelope. Cada participante teve até 15 minutos para responder o questionário e não foi permitido utilizar qualquer material para pesquisa.

Foram incluídos neste estudo todos os cirurgiões dentistas registrados no Conselho Regional de Odontologia (CRO) e que atuem no município de Passo Fundo.

Foram excluídos do estudo os cirurgiões dentistas não cadastrados no CRO, que não atuem no município de Passo Fundo e aqueles que deixarem de responder a alguma pergunta do questionário.

Análise dos dados

Os dados obtidos foram inicialmente tabulados em uma planilha eletrônica do programa Excel e exportados para o programa estatístico StataSE 12 para a análise estatística.

Primeiramente, foi realizada a análise descritiva dos dados de todas as variáveis, a fim de verificar as suas frequências absolutas e relativas.

Em um segundo momento, para as questões de número 5 a 10 do questionário, relacionadas a critério de escolha, conduta, indicação de profilaxia, momento de realização da profilaxia, medicamentos utilizados para profilaxia, as variáveis foram dicotomizadas em respostas certas e erradas, uma vez que algumas das questões possuíam mais do que uma alternativa correta. Estes dados também foram analisados por estatística descritiva.

Em relação aos resultados, a partir da tabela 2, os resultados foram analisados a partir de um total de respostas e não de entrevistados.

Para responder as questões como certas ou erradas foi realizada uma pesquisa baseada na literatura. Abaixo o questionário respondido com verdadeiro (V) ou falso (F):

QUESTIONÁRIO

Qual (ais) o (s) critério (s) que você utiliza para a seleção do antimicrobiano?

(V) Ser seletivo

(F) Ser bactericida

(F) Ação rápida

(F) Administração por via oral

(F) Baixo custo

Qual (ais) a (s) conduta (s) indicada (s) para se evitar a resistência bacteriana?

(V) Usar antibiótico somente quando necessário

(V) Usar dosagem adequado

(F) Respeitar o tempo de administração entre as doses

(F) Usar antibiótico de pequeno espectro

(F) Realizar cultura e antibiograma

Quando está indicada a profilaxia antibiótica?

(V) Risco de endocardite bacteriana

(V) Febre reumática

(V) Intervenção de área infectada

(V) Portadores de prótese cardíaca

(V) Pacientes cardiopatas

(F) Diabéticos

(F) Hipertensos

(F) Para qualquer procedimento invasivo

(F) Portadores de prótese óssea

(F) Em endodontias

Qual (ais) o (s) medicamento (s) de escolha para se realizar a profilaxia antibiótica?

(V) Ampicilina

(V) Amoxicilina

(F) Azitromicina

(F) Cefalexina

(F) Diclofenaco de Potássio

(F) Eritromicina

(F) Metronidazol

Qual (ais) o (s) medicamento (s) alternativo (s) para pacientes alérgicos às penicilinas?

(F) Amoxicilina

(F) Azitromicina

(F) Cefalexina

(V) Clindamicina

(F) Eritromicina

(F) Metronidazol

Em qual momento operatório você indica a realização de profilaxia antibiótica?

(X) Pré-operatório

( ) Pré e pós-operatório

( ) Pós-operatório

QUESTÕES ÉTICAS

O projeto foi submetido e aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa da IMED (CEP/IMED), sob número 2.056.950, e TCLE informa e esclarece o sujeito da pesquisa de maneira que ele possa tomar sua decisão de forma justa e sem constrangimentos sobre a sua participação no estudo.

O termo de confidencialidade dos dados assegura ao participante da pesquisa que não haverá qualquer identificação deste no questionário ou em alguma publicação futura.

Resultados

Com a metodologia utilizada, os dados coletados foram analisados e distribuídos em Tabelas de 1 a 5. De acordo com a tabela 1 a maioria dos entrevistados foi do sexo feminino, 92% trabalham em consultórios particulares e mais de 70% possuem uma pós-graduação em determinadas áreas odontológicas. Quanto ao tempo de formação, 66% dos entrevistados eram graduados a menos de 5 anos.

Tabela 1. Frequências relativas e absolutas da descrição da amostra

Variável

Frequência

%

Sexo

Masculino

75

31

Feminino

167

69

242

Trabalha na rede pública

Sim

19

7,85

Não

223

92,15

242

Possui alguma especialidade

Sim

175

72,32

Não

67

27,68

242

Tempo de graduação

De 0 a 5 anos

153

66,52

De 6 a 10 anos

33

14,35

Maior do que 11 anos

44

19,13

230

Em relação ao critério de escolha de um agente antimicrobiano (Tabela 2), 29% dos entrevistados escolheram ser bactericida e 23% ser administrado por via oral. Poucos profissionais responderam que utilizariam um antimicrobiano devido ao seu baixo custo. Quando a questão 6 referiu-se à conduta de se evitar a resistência bacteriana (Tabela 2), a maioria dos entrevistados escolheu a opção de utilizar antimicrobiano se necessário e em sua dosagem adequada, sendo estas as melhores formas de se evitar resistência bacteriana. Apenas 4% destes cirurgiões dentistas escolheriam um antibiótico pelo fato de ser de pequeno espectro.

Tabela 2. Descrição das respostas para as questões de critério de seleção
e conduta do uso de antimicrobianos

Questão

n

%

Total de respostas

567

Critério

Ser seletivo

100

19.61

Ser bactericida

148

29,02

Ação rápida

106

20,78

Administração por via oral

121

23,73

Baixo Custo

35

6,86

Total de respostas

510

100

Conduta

Usar antibiótico quando necessário

225

39,68

Usar dosagem adequada

153

26,98

Respeitar o tempo de administração

125

22,05

Usar antibiótico de pequeno espectro

27

4,76

Realizar cultura e antibiograma

37

6,53

Na Tabela 3 foram comparadas respostas das questões de indicação de profilaxia antibiótica e em que momento da cirurgia se utiliza essa profilaxia. Duzentos e trinta e dois entrevistados receitariam antimicrobiano para profilaxia de pacientes com possibilidade de endocardite bacteriana. Ainda sobre a indicação de profilaxia antibiótica, 21% indicariam para pacientes portadores de prótese cardíaca, 13% para pacientes que já tiveram febre reumática em algum momento de sua vida e apenas dez dos entrevistadores utilizariam para realizar um tratamento endodôntico.

Quando questionados em que momento do procedimento seria realizado a profilaxia antibiótica, 71% responderam que administrariam o medicamento no pré-operatório, assim fazendo efeito durante a cirurgia odontológica.

Tabela 3. Descrição das respostas para as questões de indicação
de profilaxia e momento de uso do antimicrobiano

Questão

n

%

Indicação Profilaxia

Risco de endocardite bacteriana

232

25,75

Febre reumática

121

13,43

Intervenção de área infectada

117

12,99

Portadores de prótese cardíaca

191

21,20

Pacientes cardiopatas

106

11,76

Diabéticos

49

5,44

Hipertensos

17

1,89

Para qualquer procedimento invasivo

35

3,88

Portadores de prótese óssea

23

2,55

Em endodontias

10

1,11

Total de respostas

901

Momento

Pré-operatório

173

71,49

Pré e pós-operatório

63

26,03

Pós-operatório

6

2,48

Total de respostas

242

Quanto a questão do antimicrobiano padrão de escolha para realizar profilaxia antibiótica (Tabela 4), 235 entrevistados utilizariam Amoxicilina como primeira escolha e Azitromicina como segunda opção. Quando questionados qual escolha de medicamento para casos de pacientes alérgicos a penicilina (Tabela 4) ocorreram porcentagens parecidas, entre os entrevistados, dos antimicrobianos Azitromicina e Clindaminina e uma porcentagem insignificativa utilizariam o Metronidazol como medicamento de escolha.

Tabela 4. Descrição das respostas para as questões relacionadas aos medicamentos de escolha padrão e nos casos de pacientes alérgicos a penicilina

n

%

Medicamentos escolha

Ampicilina

16

3,73

Amoxicilina

235

54,78

Azitromicina

98

22,84

Cefalexina

31

7,23

Diclofenaco de Potássio

1

0,23

Eritromicina

19

4,43

Metronidazol

29

6,76

Total de respostas

429

100

Medicamentos alergia

Amoxicilina

4

1,07

Azitromicina

137

36,73

Cefalexina

23

6,17

Clindamicina

149

39,95

Eritromicina

46

12,33

Metronidazol

14

3,75

Total de respostas

373

100

A tabela 5 refere-se ao percentual de acertos e erros dos entrevistados nas questões relacionadas a critério de escolha de antimicrobianos, conduta para evitar-se a resistência bacteriana, quando e qual momento está indicado o uso da profilaxia antibiótica e qual medicamento de escolha para a profilaxia. As questões com maior porcentagem de acertos foram da indicação da profilaxia antibiótica, com 85% de acertos, e em qual momento utilizá-la, com 71% de respostas corretas. Já a questão que os entrevistados mais erraram foi referente ao critério de escolha de um antibiótico, com 80% de respostas incorretas.

Tabela 5. Percentual de acertos para cada uma das perguntas

n

%

Critério se seleção de um antimicrobiano

Certo

100

19,61

Errado

410

80,39

510

Conduta para se evitar a resistência

Certo

378

66,67

Errado

189

33,33

567

Indicação profilaxia antibiótica

Certo

767

85,13

Errado

134

14,87

901

Medicamento escolha para profilaxia

Certo

251

58,51

Errado

178

41,49

429

Medicamentos Alergia a penicilina

Certo

149

39,95

Errado

224

60,05

373

Momento da profilaxia antibiótica

Certo

173

71,49

Errado

69

28,51

242

Discussão

Estimando que, 10% de todas as prescrições de antibióticos estejam relacionadas a odontologia, este trabalho teve como objetivo verificar o nível de conhecimento dos cirurgiões dentistas sobre o tema, bem como, sobre a resistência bacteriana, cujo dados foram coletados através da aplicação de um questionário formulado por Trento et al (5), com questões que serviram como instrumento para avaliar o grau deste conhecimento.

Os critérios para escolha e utilização de um antimicrobiano podem ser classificados por seu espectro de ação, por ser bactericida, pela sua forma de ação, pela maneira de administrá-lo ou por seu baixo custo. Pode-se observar na tabela 2, que a alternativa com maior porcentagem de escolha entre os entrevistados foi o uso um antimicrobiano por ser bactericida (29%) e pelo fato de ser administrado por via oral (23%). Já na pesquisa realizada por Santos et al. (20), a alternativa mais citada como critério de escolha de um antimicrobiano foi por sua administração via oral, apesar do autor relatar que a escolha de ser bactericida, é um fator de extrema importância em algumas situações, pelo fato de ser a causa da morte das bactérias. Trento et al. (5) obteve resultados parecidos com este trabalho, pois 40% dos profissionais questionados escolheram o critério de ser bactericida como melhor escolha de um antimicrobiano.

Ainda na tabela 2, pode-se observar respostas dos cirurgiões dentistas sobre a conduta para se evitar a resistência bacteriana, que tem sido causada pelo uso de antibióticos ao longo do tempo. Dos profissionais entrevistados, 225 responderam que uma das maneiras de evitar essa resistência, seria utilizar antimicrobianos somente quando necessário e, apenas 6% dos entrevistados, realizariam cultura e antibiograma em seus pacientes antes de medicá-los.

O autor Al- Haroni (6) realizou uma revisão de literatura, pelo fato da resistência ser considerada uma ameaça para saúde pública e seu controle ser prioridade internacional. Os resultados encontrados pelo autor corroboram com os deste trabalho, sendo a melhor maneira de deter a resistência, utilizado antibióticos criteriosamente e de maneira prudente, pois quanto mais utilizados forem, aumenta a seleção na população bacteriana.

Goll e Faria (7) mostram que órgãos regulamentadores deveriam oferecer uma educação continua sobre prescrição e maneira de utilizar antimicrobianos para cirurgiões dentistas, pois as prescrições de antibióticos vêm mostrando-se, na grande maioria das vezes, incorretas, tendo necessidade de uma maior fiscalização.

Pelo fato destas prescrições, na grande maioria, incorretas, Lisboa et al. (8) realizaram um estudo nas maiores redes de farmácias, sendo que das 366 prescrições observadas, apenas 12 estavam corretas, quanto ao que foi observado, mostrando inadequadas as prescrições de antibióticos realizadas por cirurgiões dentistas.

Segundo Palmer (9), deveria ser indicado o uso de antibiótico como auxiliar no tratamento cirúrgico, tratar doenças infecciosas ativas e quando se tem entendimento que irá ocorrer atraso no tratamento definitivo, raramente deve-se usar para profilaxia antibiótica. Konde et al. (10) ressaltam a importância do antibiótico ser usado como adjunto, nunca como primeira escolha.

Na tabela 3 foi relatada a indicação do uso da profilaxia antibiótica, que podem ser usadas para diversas condições, sendo maior percentual as alternativas de escolha para pacientes com riscos de endocardite bacteriana e portadores de prótese cardíaca. Apenas 2% dos entrevistados optaram em prescrever antibióticos para pacientes portadores de prótese óssea e 1% para pacientes hipertensos ou com prévio tratamento endodôntico.

Um estudo que obteve resultados similares foi realizado pelo autor Daly (11), que relata que especialistas recomendam a profilaxia antibiótica, durante tratamentos dentários específicos, para a prevenção de endocardite apenas em pacientes de risco, normalmente não recomendado para pacientes com implante de prótese óssea.

Entretanto os autores Spittle et al. (12) obtiveram resultados contraditórios desta pesquisa, com 61% dos cirurgiões dentistas Norte Americanos, entrevistados responderam prescrever antibiótico profilático para paciente com prótese óssea, mostrando não atualizados quanto as recomendações da American Heart Association e da American of Orthopaedic Surgeons.

Zahabiyoun, Sahabi e Kharazifard (13) indicam urgentemente a necessidade de campanhas educativas e orientações que promovam o uso correto de antibióticos por cirurgiões dentistas, pois 56% dos antibióticos prescritos pelos cirurgiões dentistas entrevistados, em seus estudos, foram utilizados para uso profilático.

Quanto a questão de indicação da profilaxia antibiótica para tratamentos endodônticos, Cope et al. (14) realizaram estudos com altas taxas de prescrição sem indicação apropriada, pois apesar de ser recomendado que antibióticos não devem ser prescritos na ausência de tratamento adjutório, um terço dos pacientes estudados foram tratados com um antibiótico sem receber medidas locais. Foram prescritos profilaxia antibiótica em 268 casos de pulpite sintomática e em 27 casos de pulpite reversível.

Os autores Brigantini, Marques e Gimenes (15) enfatizam que só deve ser empregada a profilaxia antibiótica, quando o risco de infecção é maior que as reações adversas que o uso do antibiótico pode causar, tendo em seu estudo a Amoxicilina como medicamento de escolha para profilaxia antibiótica.

Obtivemos neste estudo, o mesmo resultado encontrado por muitos outros autores. Na tabela 4 deste trabalho, avaliou-se as respostas dos entrevistados em relação aos antimicrobianos padrões de escolha para profilaxia antibiótica, e por qual substitui-los nos casos de pacientes alérgicos a penicilina. O antibiótico de escolha para profilaxia antibiótica para maioria dos cirurgiões dentistas entrevistados foi a Amoxicilina, seguido de 22% de escolha a Azitromicina, já para pacientes com reações alérgicas a penicilina, 39% escolheram a Clindamicina para substituí-lo.

Verificou-se nesse estudo, resposta semelhante à de muitos outros autores, como: Al-Fouzan et al. (16), Asmar et al. (17) e Perik et al. (18) que em suas pesquisas obtiveram respostas semelhantes, quanto ao medicamento de escolha para profilaxia antibiótica, todos com maior percentual de respostas para a Amoxicilina.

Michael et al. (19), em trabalho realizado nos Estados Unidos, encontrou destaque maior para a Amoxicilina, sendo a Clindamicina também muito prescrita. Santos et al. (20) obteve o mesmo resultado deste trabalho, a Amoxicilina como medicamento de primeira escolha e para pacientes alérgicos a utilização da Clindamicina.

Apesar da maioria dos entrevistados escolherem a opção correta para antibiótico de escolha para prescrição profilática, um dos entrevistados escolheu a opção Diclofenaco de Potássio como antimicrobiano de escolha, sendo esse um Anti-inflamatório.

Pelas ações nocivas que antimicrobianos podem causar em nossos organismos, Gaujac et al. (21) realizaram estudos para mostrar a importância do cirurgião dentista conhecer o mecanismo de ação de cada medicamento utilizado em seu consultório para qualquer reação alérgica, pois estes podem causar desde eritemas e até reações anafilaxias.

Na última questão do questionário (Tabela 3), abordou-se em que momento do procedimento seria indicada a realização da profilaxia antibiótica. E deste modo, obteve-se 71% das respostas que a profilaxia antibiótica deveria ser realizada no momento pré-operatório, seguida de 26% que utilizariam no pré e pós-operatório, e apenas 2% indicariam a profilaxia apenas no pós-operatório. Asmar et al. (17) concluíram que muitas vezes os cirurgiões dentistas não seguem as orientações atuais para prescrição de antibióticos, tanto terapêuticos, quanto profiláticos.

Costa et al. (22) realizaram seu estudo com alunos de uma Faculdade de Odontologia, e concluíram ser necessário mudanças no método de ensino da disciplina de farmacologia, pois 45% dos alunos relatavam dúvidas frequentes no momento da prescrição.

Na Tabela 5, pode-se verificar o percentual de acertos e erros das questões dos questionários. A questão que obteve mais erros foi relacionada ao critério de escolha de um antimicrobiano, com 80% de respostas erradas, e as questões com maior percentual de acerto entre os entrevistados foi o momento operatório da indicação da profilaxia e para que casos ela está indicada.

Após a metodologia empregada, podemos observar que cirurgiões dentistas possuem um nível de conhecimento baixo sobre antimicrobianos e resistência bacteriana, muitos se negando a responder os questionários durante a pesquisa por falta de conhecimento e alguns entrevistados cometendo graves erros no medicamento de escolha para pacientes alérgicos a penicilina, já que estes marcaram a opção do uso do antimicrobiano Amoxicilina. Os profissionais não sabem diferenciar a profilaxia pré e pós-operatória e com respostas incorretas quando questionados em que caso deveria ser utilizada.

Um dado importante desse trabalho é que a composição da amostra foi formada, majoritariamente por profissionais recém-formados (de 0 a 5 anos de formação), o que indica a necessidade de uma maior atenção aos conteúdos específicos relacionados a prescrição de antimicrobianos durante a graduação, bem como nos cursos de especialização. Nesse contexto, os resultados desse trabalho demonstram que o perfil atual do aluno de graduação não tem conseguido absorver o conhecimento necessário a sua atuação profissional no quesito prescrição medicamentosa.

Alguns profissionais, cirurgiões dentistas, encontram-se incapacitados na prescrição desta classe de medicamento e com pouco conhecimento sobre o que fazer para evitar este problema que é a resistência bacteriana. Por ser dever oferecer um atendimento adequado ao paciente, evitando problemas futuros, cada profissional deve pesquisar e atualizar-se sobre esse assunto que é recorrente dentro dos consultórios, sendo também necessário incentivos de órgãos como CROs e unidades de ensino para proporcionar palestras e informações sobre as novas atualizações.

Conclusão

Com este trabalho podemos concluir que cirurgiões dentistas possuem pouco conhecimento sobre antimicrobianos e o que deve ser feito para evitar a resistência bacteriana.

Muitos têm dúvida em relação a indicação da profilaxia antibiótica, qual medicamento de escolha e em que momento do procedimento se deve utilizá-la. A maioria não sabe a importância e o grande problema que é a resistência bacteriana e as consequências decorrentes do uso incorreto desta classe de medicamento.

Se faz necessário que os cirurgiões dentistas melhorem os critérios do uso e prescrição de antimicrobianos, e deveria ser oferecido educação continuada sobre este assunto para profissionais, cirurgiões dentistas, diminuírem a incidência de problemas relacionados a esses medicamentos.

Referências

  1. 1. Fuchs FD, Wannmacher. Farmacologia Clínica: Fundamentos da Terapêutica Racional. 4 º. Ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2012.
  2. 2. Brunton LL, Chabner BA, Knollmann BC. As Bases Farmacológicas da Terapêutica de Goodman e Gilman. 12. Ed. Porto Alegre: AMGH; 2012.
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Journal of Oral Investigations, Passo Fundo, vol. 8, n. 1, p. 18-33, Janeiro-Junho, 2019 - ISSN 2238-510X

[Recebido: Agosto 15, 2018; Aceito: Outubro 16, 2018]

DOI: https://doi.org/10.18256/2238-510X.2019.v8i1.2909

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